segunda-feira, julho 10, 2006

PORTUGAL NO MUNDIAL/2 006: BALANÇO FINAL

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A proeza dos “Magriços” foi quase igualada!

O Vice-campeão Europeu chega ao 4º lugar no “Mundial”!

Portugal tem orgulho na sua Selecção!

Sim, tudo isto é verdade. Mas talvez valha a pena, agora que as emoções já pertencem ao passado e a lucidez volta a poder respirar, tecer alguns comentários serenos, objectivos e ponderados à nossa participação no Mundial da Alemanha, ou melhor, à participação do nosso Futebol, que escapem aos insuportáveis lugares comuns dos especialistas da “bola”, às estéreis proclamações dos nossos ilustres políticos e comentadores de ocasião e, sobretudo, aos desbragados fanatismos do “homem da rua”…

No final: o balanço é positivo ou negativo?

Se compararmos com as nossas anteriores participações em Mundiais, concluiremos facilmente que o balanço é positivo. Mas se aferirmos pelas expectativas criadas, sobretudo após a eliminação da Holanda, já talvez tenhamos de nos ficar por um neutro “assim-assim”…

De facto, mais uma vez chegamos alto para no final cairmos: no “Euro” perdendo a Final (em casa!), contra uma selecção sem historial, agora na Alemanha perdendo os dois últimos jogos, sem apelo nem agravo.

Para quem pretenda ir além das paixões, tantas vezes mal fundamentadas, e extraír conclusões que possam trazer benefícios para o futuro, há que descolar do discurso superficial, simplista e eufórico dos meios de comunicação, que para nada serve, e fazer uma análise desapaixonada do que realmente sucedeu.

Sintetizando, direi que a Selecção portuguesa até esteve à altura do acontecimento, mostrou qualidades e valor, mas decepcionou em muitos aspectos.

Passada que fora a época das grandes exigências à “geração de ouro”, que acabou por afinal não ganhar nada mais para Portugal do que os dois Mundiais de Juniores conquistados sob o comando de Carlos Queirós, de Portugal esperava-se apenas que se afirmasse como potência mundial do futebol, defendendo o prestígio da sua condição de Vice-campeão europeu. E foi o que aconteceu.

Por isso dou os meus parabéns à Federação Portuguesa de Futebol e a toda a nossa Selecção, nomeadamente aos jogadores (e também ao treinador). Cumpriram com mérito todos os objectivos traçados, o que para Portugal já não é nada pouco…

Contudo, deveremos contentar-nos com o registo deste feito? Ou haverá mais alguma coisa a salientar?

Estou em crer que sim, há lições a apreender para além desta apreciação positiva, que permitem especular até que se poderia, eventualmente, ter ido mais além.

Assim, foram para mim mais do evidentes dois aspectos basilares em que não estivémos tão bem quanto poderíamos: o desempenho colectivo e a questão disciplinar!

Com um lote de jogadores francamente acima da média, em termos de qualidade individual, foi decepcionante constatar, durante todo o decorrer do Campeonato, que uma tal mais-valia não chegou nunca a ser adequadamente traduzida em valor colectivo! A Selecção não conseguiu de facto impor um estilo de jogo personalizado e característico, vivendo sempre muito da improvisação, da garra e dos lances individuais, para além de um notável espírito de entreajuda e um grande querer colectivo, mas que não teve correspondência em termos do chamado "fio de jogo".

Culpa de Scolari? Pois, de quem mais? Com aquele lote de jogadores, parece-me legítimo exigir muito mais enquanto equipa!… Pois a verdade é que, se ao actual seleccionador nacional se reconhecem bastas qualidades enquanto organizador, mentor dos jogadores, fonte de força anímica e até qualidades técnicas e tácticas, não deixa todavia de se manter este grande, enorme ponto de interrogação: que fariam com esta “matéria-prima” treinadores como J. Mourinho, Carlos Queirós, S. G. Eriksson, ou o próprio treinador da Grécia no Euro/2004 (Otto Rehagel)?

Para além de que ficaram ainda a pairar no ar outras questões nebulosas, em que ninguém parece atrever-se a tocar, mas que a mim soam como um ruído de fundo insuportável: porquê a insistência em jogadores claramente “desinseridos” desta equipa, como Deco, Pauleta, ou mesmo Cristiano Ronaldo? Porquê o escandaloso bloqueio a um jogador multi-facetado e experiente como Nuno Gomes?

Questões que aliás não ressaltam apenas dos resultados negativos dos dois últimos jogos, mas antes foram patentes ao longo de todo o torneio – a irrelevância da ausência de Deco para a eliminação da Holanda e da Inglaterra, o desperdício do talento individual(ista...) de C. Ronaldo em exibicionismos estéreis, a incapacidade de integrar Pauleta num esquema de jogo que comprovadamente não produz situações “mortíferas” dentro da área (única especialização deste jogador). Tudo tarefas que são da exclusiva responsabilidade do Treinador...

Mais grave ainda, o aspecto disciplinar: não fora o desvario de Zidane na Final, Portugal teria ficado para a história deste Mundial como o último País a jogador à boa velha maneira latino-americana (à excepção do Brasil): cacetada e teatro em vez de futebol! A juntar à imagem semelhante (ou até pior!) que já nos ficara colada em 2002 na Coreia! E isso é uma vergonha para o nosso meio futebolístico, a que ninguém deu o devido relevo (Portugal ficou como recordista em cartões!)...

Aqui, contudo, as culpas não serão nem exclusiva nem principalmente de L. F. Scolari, mas de tudo aquilo em que assenta o nosso futebol doméstico, nomeadamente as arbitragens, dirigismo desportivo, jornalismo, etc.…

Veja-se a exemplar diferença dos meios de comunicação de Inglaterra, que desde o início criticaram o jogo maçador e desinteressante da sua selecção, apesar de eficaz... até ao jogo com Portugal (como o nosso o foi até aos Quartos-de-Final...)!

Concluindo: Portugal tem muitas razões para festejar a sua participação neste Campeonato do Mundo, mas ainda mais razões para lamentar não termos até hoje conseguido resolver os graves problemas estruturais do nosso futebol, que continua a precisar de grandes e geniais intérpretes para se afirmar internacionalmente, ao contrário de Países como a Itália, a França, a Argentina, a Alemanha, a Inglaterra, etc., que resistem muito melhor às flutuações das “colheitas” geracionais e, continuadamente, mesmo com jogadores individualmente medianos, fazem sempre boa ou razoável figura nestas competições…

Por isso, apesar do desapontamento causado sobretudo pela nossa terceira eliminação em meias-finais contra a França, manifesto a minha satisfação pelo facto de termos de “engolir” algum triunfalismo e vaidade excessivos, face ao nosso real valor, e por não termos o infortúnio de ver o mundo do futebol lusitano exultar, imerecidamente, com feitos que poderiam toldar-nos o discernimento e premiar o que ainda continua mal no nosso futebol, apesar de felizmente já não estarmos propriamente ao nível do que se passou em Saltillo, ou na Coreia.

É que não sobram dúvidas de que para irmos mais além, se é que algum dia vamos querer viver a festa que os outros é que fazem sempre, há ainda aspectos essenciais a modificar. Nas estruturas desportivas, como é óbvio, mas igualmente nas escolas, nos meios de comunicação social, em suma, nas mentalidades.

E, enquanto o ignorarmos, ficaremos sempre aquém dos nossos desejos e potencialidades!…
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