terça-feira, julho 03, 2007

ELEIÇÕES INTERCALARES PARA A CÂMARA DE LISBOA


O que está em jogo?

Submergido pela barragem propagandística das habituais campanhas partidárias e pela cacofonia superficial e labrega dos nossos conhecidos órgãos de “desinformação”, o Cidadão lisboeta esforça-se por tentar entender o que realmente irá estar em causa nestas peculiares eleições intercalares, só para a Câmara Municipal de Lisboa.

O aspecto que parece mais relevante é o estado em que se encontram as finanças municipais. Sendo hábito entre nós nunca procurar - e muito menos responsabilizar - os culpados por situações como estas, resta-nos esperar que a inevitável mudança de côr política na Presidência da Câmara traga algumas pistas de solução para este gigantesco tormento. Que, no entanto, corre o risco de ficar de imediato “esquecido”, num mandato demasiado curto para medidas de fundo e que, todo ele, irá decorrer em “contra-relógio”, logo desde o início condicionado pelas próximas eleições autárquicas, já dentro de dois anos…

O segundo aspecto que interessa aos lisboetas é a questão da corrupção, que não se resume às suspeitas e investigações em curso sobre o mandato desfeito do Eng.º Carmona Rodrigues, antes se enraíza em todo um passado mais ou menos recente e, acima de tudo, se teme esteja visceralmente entranhada no próprio funcionamento interno da Câmara como um todo orgânico, nas suas vertentes política, mas igualmente técnica e administrativa, com elevada probabilidade de continuar teimosamente a conspurcar e a minar a acção dos órgãos autárquicos.

Perante tudo isto, até parecem “menores” os principais problemas crónicos da Cidade, como são a má qualidade de vida e do ambiente, o decréscimo global da população residente, o despovoamento da Baixa, a degradação do património edificado (em particular o habitacional) e do espaço público em geral, a falta de estacionamento e de transportes públicos adequados, o autêntico “garrote” constituído pelo Porto de Lisboa, a fluidez do trânsito, a ausência de políticas sociais e culturais eficazes, a morte anunciada do comércio tradicional, o grande imbróglio em que se tornou a “gestão urbanística” do Parque das Nações

Após quase uma década de flagrante inoperância e de puro desnorte, com a revisão do Plano Director Municipal num impasse total e os “buracos” urbanos a proliferarem – Parque Mayer, Feira Popular, Artilharia Um, Poço do Bispo, terrenos dos dois principais clubes de futebol, etc. –, a par de uma multiplicidade de intenções megalómanas não concretizadas (excepto nos casos sintomáticos do Túnel do Marquês e do Casino de Lisboa) e da continuação da política do “puzzle” urbano, à base de acrescentos avulsos e erráticos, ao sabor das tendências do retalho imobiliário (condomínios fechados ou edifícios “(a)berrantes”, desintegrados do contexto urbano), para já não falar nas desgraças impostas por certas intervenções da Administração Central, como as infindáveis obras no Terreiro do Paço (Metro), na Av. Duque de Ávila (idem) e no Túnel do Rossio (REFER), a recente “remodelação” da rede da CARRIS e, ainda, a “morte lenta” permanente na Segunda Circular por falta de conclusão da C. R. I. L., estaria mais do que na hora de tomar decisões estratégicas e, seguidamente, pôr “mãos à obra”!

Em vez disso, os principais candidatos entretêm-se com “jogos florais” à volta dos debates televisivos e tempos de antena, ou da manutenção do Aeroporto da Portela (uma decisão que transcende a Câmara!), das empresas municipais (com intenções desbragadas de extinções e fusões sem qualquer critério perceptível), ou ainda, pasme-se, da criação ou não das famosas “salas de chuto”…

Mas propostas sérias e credíveis: quem já as formulou? Apenas conheço uma, da parte de António Costa (honra lhe seja feita), que teve a coragem de, pela primeira vez, abordar desassombradamente as responsabilidades efectivas da Câmara, através do P. D. M. (em fase de revisão), no destino a dar aos terrenos do actual Aeroporto de Lisboa, que muito bem defende seja um segundo Parque Florestal, como o de Monsanto. Para além de outras ideias originais mas mais sectoriais, como a gestão “inteligente” da capacidade viária (que pretende variável) de artérias urbanas como as Avenidas 24 de Julho e Infante D. Henrique, por exemplo. Mas será que tudo isto não passará de promessas de campanha? É o que veremos, segundo dizem todas as sondagens, nos próximos dois anos...

E perante toda esta diversidade e magnitude de problemas na própria Capital do País, que para mais agora se expõe inapelavelmente a toda a Europa, o que menos nos faltava era querer-se “usar” estas eleições para tirar dividendos políticos a nível nacional. Mas até a isto o principal Partido da Oposição – e máximo responsável pela deprimente situação a que chegou a Câmara de Lisboa – conseguiu chegar!

Não satisfeito com a incapacidade de fazer uma decente auto-crítica sobre os resultados da sua actuação em Lisboa nos últimos cinco anos e meio e com a própria escolha de um candidato de recurso e manifestamente “de segunda”, sem programa nem carisma, para cabeça-de-lista na Capital, o Partido liderado por Marques Mendes constitui hoje a maior prova do descrédito a que o exercício da política “convencional” está a chegar em Portugal…


Ant.º das Neves Castanho.