quarta-feira, julho 13, 2005

REGIONALIZAÇÃO (III)

A NÃO-REGIONALIZAÇÃO!

"No próximo texto tentarei desmistificar aquilo que não é a Regionalização, para começar depois a introduzir concretamente o tema e a desvendar em que consiste e como foi aplicada nos Países em que já vigora, nomeadamente naqueles cujos sistemas político e administrativo mais semelhanças têm com o nosso."

Este era o meu intento no penúltimo "postal" editado sobre o assunto, já lá vão algumas semanas… Para não defraudar os meus fiéis (e pacientes…) leitores, aqui está então o cumprimento desta minha promessa.

Para quem não lida de perto com esta problemática, "regionalizar" o País tem sempre um primeiro significado simplista que é o de "dividir". Esquece-se, quem assim pensa, que o território já está de sobra "dividido", no caso do Continente em 308 Municípios (se é que entretanto não estou já desactualizado, mas o rigor aqui não é importante)!

Mas há mais: Portugal Continental encontra-se já "dividido" de muitas outras maneiras, consoante os critérios – em onze Províncias (divisão administrativa formalmente já extinta, mas sociologicamente ainda muito presente), em dezoito Distritos (aos quais correspondem ainda dezoito Governos-Civis e, muito importante, também dezoito círculos eleitorais para a Assembleia da República e, consequentemente, ainda estruturam a organização territorial dos Partidos), em cinco «Regiões-Plano» (nome este já da era tecnocrática…), que por sua vez ainda se sub-dividem em Sub-regiões (N. U. T.'s III) e Sub-sub-regiões (N. U. T.'s IV!...) e ainda em Regiões Militares, em Dioceses e muitas, muitas outras formas de desagregação, consoante os propósitos e as entidades em causa.

Já para não falarmos das "velhas" Associações de Municípios e, igualmente, dos mais recentes (e entretanto revogados…) modelos de sub-divisão territorial, também com base na simples agregação do Concelhos – as famigeradas "Áreas Metropolitanas"…

Cito tudo isto, não com o propósito de desenvolver esta matéria, mas apenas para opinar que, apesar de todas estas divisões territoriais, que se sobrepõem de uma forma, aliás, algo confusa e descoordenada, nunca por sua causa alguém alvitrou que estivesse em perigo a unidade nacional, ou até a identidade do País, como se alardeou, com todo o espavento, a propósito da Regionalização.

Mas então e todas estas formas, não serão elas já um primeiro passo para a mesma Regionalização? A resposta é não, e esse é que é o verdadeiro problema!

Todas estas formas de sub-divisão territorial, bem como aquelas que existem legalmente mas que não cheguei a enumerar, corporizam meras desconcentrações administrativas, o que significa que não podem nunca assimilar-se, ou por algum passe de magia vir, um dia, a transmutar-se em qualquer forma descentralizada de administração pública!

Mesmo aquela divisão territorial que todos identificam como podendo vir a constituir a matriz geográfica da futura Regionalização – estou a falar das cinco Regiões-Plano (ou N. U. T.'s II) –, não passa ela própria de uma mera organização territorial dos serviços de alguns Ministérios (ainda há outros, como o da Administração Interna, por exemplo, que continuam a basear-se apenas nos velhos Distritos!), ou seja, nasceram de cima para baixo e possuem órgãos que dependem única e exclusivamente do Poder Central, com uma autonomia apenas funcional e sem qualquer legitimação democrática na zona a que correspondem!

Mesmo os órgãos regionais mais conhecidos da opinião pública, como são as famosas cinco Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regionais (CCDR's), não passam de meras delegações de um único Ministério, sem poderes para falar sequer por qualquer outra estrutura governamental, nem autonomia para decidir localmente seja o que for que transcenda as estritas competências desse mesmo Ministério (que está sempre a mudar de nome, mas que na maior parte do tempo tem sido designado por Ministério do Equipamento, Planeamento e Administração do Território, MEPAT para os amigos)!!

A tristíssima ideia do Governo anterior (ou terá sido do antecedente? Vai dar ao mesmo…) de introduzir uma suposta componente "localista" na nomeação (repare-se, nem sequer é eleição!...) dos Presidentes das tais CCDR's, através duma dita "auscultação" dos senhores presidentes das câmaras – situação híbrida com que este Governo, e muito bem, já acabou –, apenas veio contribuir para aumentar ainda mais a confusão sobre este assunto, levando os incautos a pensar, erradamente, que lá se estava a dar mais um passinho no sentido da tal regionalização "tranquila", na suave mas infeliz expressão do senhor Miguel Relvas, ex-responsável governamental por este assunto (e por outros, infelizmente, na minha livre e modesta opinião, claro está…).

Mas tal não é, de facto, verdade, nem anda lá perto, aliás. A desconcentração é uma forma perfeitamente legítima de um determinado nível duma administração (pública ou privada) tornar a sua acção mais eficiente, em termos espaciais, mas é completamente inócua para o objectivo que está por detrás da chamada Regionalização, que é, como já salientei, a descentralização administrativa.

É assim como uma pessoa pretender ir de avião de Lisboa para Londres e começar por ir comprar o bilhete à... Estação de Santa Apolónia! Haverá alguém que acredite que, apesar de tudo, vale sempre a pena lá ir, quanto mais não seja para tentar informar-se sobre onde se poderá ir comprar a passagem aérea? Pois bem, é assim, neste tipo de raciocínios, que se perde ainda uma "boa" parte dos nossos políticos de primeira água (mesmo os "topo-de-gama"!). E quero crer que isto só acontece por pura ignorância sobre o assunto, pois ainda acredito que nem todos ajam com inconfessáveis intuitos manipuladores, mas sinceramente não estou em condições de afiançar…

Sintetizando, a desconcentração administrativa (como igualmente a nossa já conhecida deslocalização...), sendo uma mera organização hierárquica e no espaço de um determinado tipo de Poder, como o de um Ministério, por exemplo, não adianta nem atrasa o que quer que seja para a implementação de uma autêntica descentralização, que tem uma natureza intrínseca radicalmente diferente!

E porquê? Porque a descentralização exige a transferência, para um órgão democraticamente legitimado e independente de tutelas (que não sejam, unicamente, as que decorrem da necessária verificação da legalidade, como aliás se passa já hoje com as Regiões Autónomas e as Autarquias Locais), de competências próprias sobre determinados assuntos, competências estas a serem exercidas sobre uma determinada zona geográfica, bem delimitada.

Este requisito é, por definição, incompatível com qualquer forma de desconcentração, dado que os organismos que resultam da mesma continuam a ser dependentes do poder superior e limitam-se a exercer as competências que esse órgão superior detém.

Como não têm rigorosamente nada em comum, sem ser eventuais coincidências dos respectivos mapas, estas duas formas de espacialização administrativa devem, de uma vez por todas, deixar de ser confundidas pela opinião pública e, em especial, pela opinião publicada (ou, pelo menos, pela opinião esclarecida e bem informada…). Espero, por isso, que esta questão tenha ficado bem clara e, para já, termino.

No próximo texto procurarei então desenvolver, ou começar a tratar, a segunda parte da promessa recordada no primeiro parágrafo…

2 Comments:

Blogger Geosapiens said...

Três optimos artigos....muito bons mesmo...tornei-me num leitor assiduo do seu Blog...continue com este...um abraço

5:13 da tarde  
Blogger Geosapiens said...

...caro amigo...fiz um post sobre as candidaturas independentes...acho que devias ler...um abraço...

11:46 da tarde  

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