quarta-feira, julho 27, 2005

Democratizar: PRESIDENCIAIS I

Acho muito perigosa e até irresponsável a ideia, maciçamente propagada pelos vários sectores da Direita política e economico-financeira, de que a governação, de um modo geral - incluindo assim a mais elevada magistratura da República -, se deve subordinar a(os seus) ditames económicos.

Trocando por miúdos, isto significaria que o resultado das eleições democráticas teria sempre menos valor do que a competência técnica a exigir aos governantes, ou seja, ganhassem ou perdessem as eleições, as políticas de Direita teriam sempre que ser aplicáveis, pois só assim seria garantida uma eficiente governação!

É verdade, parece a história da carochinha, mas o facto é que podemos lê-la todos os dias nos jornais, ouvi-la nas rádios e vê-la nas tv's. Até à náusea (e foi com base nela que se intercalou o infeliz consulado do Durão&sucr.s)!!

E para isto ser possível, na actual conjuntura, parecia haver um método expedito e quase 100% seguro: instar o velho professor Cavaco (sim, o tal "salvador da pátria" que desistiu inexplicavelmente de ser Primeiro-Ministro e que, logo a seguir, foi humilhantemente derrotado nas presidenciais por uma "segunda figura" socialista) a candidatar-se a Belém!

Com este esquema, conseguir-se-ia pressionar o Governo a agir, não de acordo com o seu Programa, sufragado clara a inequivocamente pelo Povo nas Legislativas de Fevereiro, mas sim de acordo com os interesses de quem patrocinara a ida de Cavaco para Belém, ou pior ainda, no temor de ser sabotado, manietado, ou até destituído, pela acção presidencial, constituída assim unicamente em contra-poder (à semelhança do que o velho professor tanto se queixou no mandato de Soares, que ele próprio contribuíu para re-eleger em 91!!!).

Parece que tudo isto começa agora a ficar bastante comprometido (logo à partida a própria apresentação do velho professor às urnas!), para grande desespero da Direita...

Mas esta posição, de momento, é mesmo a única saída para quem não tem mais nada para dizer. E o facto é que, se Portugal parece estar num momento histórico caracterizável como de impasse, ou de "beco sem saída", em grande parte o deve à Direita: primeiro, porque foi ela que mais tempo nos governou – por incrível que pareça, até mesmo desde a instauração da Democracia! -, segundo e principalmente porque, na actual conjuntura politico-económica, a Direita NÃO DISPÕE DE QUALQUER MODELO PARA O PAÍS!

Dito de outro modo, a Direita portuguesa não tem qualquer ideia para o futuro de Portugal (sem ser o aumento dos lucros dos seus negócios!...)! Daí que precise de prosseguir nesta dupla estratégia:

1º) Impedir a Esquerda de governar, instalando um contra-poder em Belém (de preferência especialista em "assuntos económicos");

2º) Fingir que tem um projecto para o País, limitando toda a discussão em torno das questões financeiras conjunturais (o "défice")...

E para isto dispõe de um arsenal impressionante de meios de propaganda e intoxicação da frágil e desinformada opinião pública portuguesa...

Neste momento é pois crucial que a opinião pública desperte e tome consciência da verdadeira situação do País. Que não é só preocupante ao nível económico (aliás, o estado da economia é apenas um reflexo da POBREZA GERAL em que Portugal se encontra mergulhado e que ainda VEM DESDE O SALAZARISMO!), mas sobretudo ao nível social! Estamos atrasados DÉCADAS em relação aos nossos principais concorrentes europeus, mas é sobretudo na Educação, na Administração Pública, nas mentalidades e, em consequência disso, na classe política (ou melhor, de um modo geral, nas "élites" intelectuais!)!

Quem levará a melhor, o neo-salazarismo miguelista mascarado de neo-liberalismo, ou os ideais progressistas e desenvolvimentistas?

Precisamos urgentemente de aproveitar esta conjuntura política favorável para reganhar a esperança de recuperar o atraso! Precisamos de Fontes Pereiras de Melos e de Duartes Pachecos, não de oliveiras salazares de pacotilha (sim, que o original não se compara às cópias que "andem por aí"...)!

Para que conste, este autor deste "blog" apoia um novo movimento de regeneração e modernização nacionais, que urge dinamizar! Se perdermos esta oportunidade (um Governo progressista, mas competente, durante oito anos consecutivos), será muitíssimo mais difícil!...

Por esta e por todas as outras razões possíveis e imagináveis, este autor deste "blog" apoiará a candidatura presidencial de Mário Soares, ou de qualquer outro candidato que partilhe desta visão do País, de preferência com a sua estatura, com o seu perfil, com a sua experiência, com as suas ideias!


P. S.: Um grupo de treze economistas descobriu hoje o que já deveria ter descoberto há muito tempo (nomeadamente no tempo de Cavaco e Ferreira do Amaral): que os investimentos no betão são inúteis e que Durão Barroso apenas quis dar espectáculo gratuito na cimeira da Figueira quando acordou o TGV com os espanhóis!

Eu até talvez concorde com os treze economistas - já concordava no tempo da betoneira do Amaral e, pelos vistos, a situação do País provou que eu tinha razão! -, mas com o que não concordo é com a sua cínica forma de intervir, pressionando e condicionando a ignorante opinião pública portuguesa (vejam só o destaque que lhes foi dado, como se dissessem alguma coisa de novo...), que tem uma memória curta (amanhã os mesmos economistas poderão sempre vir dizer o oposto, se isso for da sua conveniência, claro...).

"O Casimiro (...) tinha um nariz que parecia um elefante..."

quarta-feira, julho 13, 2005

REGIONALIZAÇÃO (III)

A NÃO-REGIONALIZAÇÃO!

"No próximo texto tentarei desmistificar aquilo que não é a Regionalização, para começar depois a introduzir concretamente o tema e a desvendar em que consiste e como foi aplicada nos Países em que já vigora, nomeadamente naqueles cujos sistemas político e administrativo mais semelhanças têm com o nosso."

Este era o meu intento no penúltimo "postal" editado sobre o assunto, já lá vão algumas semanas… Para não defraudar os meus fiéis (e pacientes…) leitores, aqui está então o cumprimento desta minha promessa.

Para quem não lida de perto com esta problemática, "regionalizar" o País tem sempre um primeiro significado simplista que é o de "dividir". Esquece-se, quem assim pensa, que o território já está de sobra "dividido", no caso do Continente em 308 Municípios (se é que entretanto não estou já desactualizado, mas o rigor aqui não é importante)!

Mas há mais: Portugal Continental encontra-se já "dividido" de muitas outras maneiras, consoante os critérios – em onze Províncias (divisão administrativa formalmente já extinta, mas sociologicamente ainda muito presente), em dezoito Distritos (aos quais correspondem ainda dezoito Governos-Civis e, muito importante, também dezoito círculos eleitorais para a Assembleia da República e, consequentemente, ainda estruturam a organização territorial dos Partidos), em cinco «Regiões-Plano» (nome este já da era tecnocrática…), que por sua vez ainda se sub-dividem em Sub-regiões (N. U. T.'s III) e Sub-sub-regiões (N. U. T.'s IV!...) e ainda em Regiões Militares, em Dioceses e muitas, muitas outras formas de desagregação, consoante os propósitos e as entidades em causa.

Já para não falarmos das "velhas" Associações de Municípios e, igualmente, dos mais recentes (e entretanto revogados…) modelos de sub-divisão territorial, também com base na simples agregação do Concelhos – as famigeradas "Áreas Metropolitanas"…

Cito tudo isto, não com o propósito de desenvolver esta matéria, mas apenas para opinar que, apesar de todas estas divisões territoriais, que se sobrepõem de uma forma, aliás, algo confusa e descoordenada, nunca por sua causa alguém alvitrou que estivesse em perigo a unidade nacional, ou até a identidade do País, como se alardeou, com todo o espavento, a propósito da Regionalização.

Mas então e todas estas formas, não serão elas já um primeiro passo para a mesma Regionalização? A resposta é não, e esse é que é o verdadeiro problema!

Todas estas formas de sub-divisão territorial, bem como aquelas que existem legalmente mas que não cheguei a enumerar, corporizam meras desconcentrações administrativas, o que significa que não podem nunca assimilar-se, ou por algum passe de magia vir, um dia, a transmutar-se em qualquer forma descentralizada de administração pública!

Mesmo aquela divisão territorial que todos identificam como podendo vir a constituir a matriz geográfica da futura Regionalização – estou a falar das cinco Regiões-Plano (ou N. U. T.'s II) –, não passa ela própria de uma mera organização territorial dos serviços de alguns Ministérios (ainda há outros, como o da Administração Interna, por exemplo, que continuam a basear-se apenas nos velhos Distritos!), ou seja, nasceram de cima para baixo e possuem órgãos que dependem única e exclusivamente do Poder Central, com uma autonomia apenas funcional e sem qualquer legitimação democrática na zona a que correspondem!

Mesmo os órgãos regionais mais conhecidos da opinião pública, como são as famosas cinco Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regionais (CCDR's), não passam de meras delegações de um único Ministério, sem poderes para falar sequer por qualquer outra estrutura governamental, nem autonomia para decidir localmente seja o que for que transcenda as estritas competências desse mesmo Ministério (que está sempre a mudar de nome, mas que na maior parte do tempo tem sido designado por Ministério do Equipamento, Planeamento e Administração do Território, MEPAT para os amigos)!!

A tristíssima ideia do Governo anterior (ou terá sido do antecedente? Vai dar ao mesmo…) de introduzir uma suposta componente "localista" na nomeação (repare-se, nem sequer é eleição!...) dos Presidentes das tais CCDR's, através duma dita "auscultação" dos senhores presidentes das câmaras – situação híbrida com que este Governo, e muito bem, já acabou –, apenas veio contribuir para aumentar ainda mais a confusão sobre este assunto, levando os incautos a pensar, erradamente, que lá se estava a dar mais um passinho no sentido da tal regionalização "tranquila", na suave mas infeliz expressão do senhor Miguel Relvas, ex-responsável governamental por este assunto (e por outros, infelizmente, na minha livre e modesta opinião, claro está…).

Mas tal não é, de facto, verdade, nem anda lá perto, aliás. A desconcentração é uma forma perfeitamente legítima de um determinado nível duma administração (pública ou privada) tornar a sua acção mais eficiente, em termos espaciais, mas é completamente inócua para o objectivo que está por detrás da chamada Regionalização, que é, como já salientei, a descentralização administrativa.

É assim como uma pessoa pretender ir de avião de Lisboa para Londres e começar por ir comprar o bilhete à... Estação de Santa Apolónia! Haverá alguém que acredite que, apesar de tudo, vale sempre a pena lá ir, quanto mais não seja para tentar informar-se sobre onde se poderá ir comprar a passagem aérea? Pois bem, é assim, neste tipo de raciocínios, que se perde ainda uma "boa" parte dos nossos políticos de primeira água (mesmo os "topo-de-gama"!). E quero crer que isto só acontece por pura ignorância sobre o assunto, pois ainda acredito que nem todos ajam com inconfessáveis intuitos manipuladores, mas sinceramente não estou em condições de afiançar…

Sintetizando, a desconcentração administrativa (como igualmente a nossa já conhecida deslocalização...), sendo uma mera organização hierárquica e no espaço de um determinado tipo de Poder, como o de um Ministério, por exemplo, não adianta nem atrasa o que quer que seja para a implementação de uma autêntica descentralização, que tem uma natureza intrínseca radicalmente diferente!

E porquê? Porque a descentralização exige a transferência, para um órgão democraticamente legitimado e independente de tutelas (que não sejam, unicamente, as que decorrem da necessária verificação da legalidade, como aliás se passa já hoje com as Regiões Autónomas e as Autarquias Locais), de competências próprias sobre determinados assuntos, competências estas a serem exercidas sobre uma determinada zona geográfica, bem delimitada.

Este requisito é, por definição, incompatível com qualquer forma de desconcentração, dado que os organismos que resultam da mesma continuam a ser dependentes do poder superior e limitam-se a exercer as competências que esse órgão superior detém.

Como não têm rigorosamente nada em comum, sem ser eventuais coincidências dos respectivos mapas, estas duas formas de espacialização administrativa devem, de uma vez por todas, deixar de ser confundidas pela opinião pública e, em especial, pela opinião publicada (ou, pelo menos, pela opinião esclarecida e bem informada…). Espero, por isso, que esta questão tenha ficado bem clara e, para já, termino.

No próximo texto procurarei então desenvolver, ou começar a tratar, a segunda parte da promessa recordada no primeiro parágrafo…

segunda-feira, julho 11, 2005

REGIONALIZAÇÃO (II)

Vamos então por partes.

A tão necessária e propalada Reforma da Administração Pública não consiste nem se esgota, obviamente, na Regionalização. Mas pode e deve incluí-la, com a maior brevidade.

A Regionalização é, quanto a mim, um imperativo nacional, mas não só, nem sobretudo, por razões de desenvolvimento equilibrado do território do Continente. É-o principalmente por razões de natureza Política! Explico porquê.

O desenvolvimento verificado efectivamente, nos últimos trinta anos, nas Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, pode considerar-se em grande parte devido à descentralização operada, mas igualmente porque se tem registado um desproporcionado FAVORECIMENTO destas duas Regiões por parte dos Governos da República, por motivos que, sinceramente, só posso relacionar com uma certa cobardia política, associada a um eventual receio (patético) de se virem a desenvolver movimentos independentistas (que, está hoje provado, seriam economicamente insustentáveis).

Nada prova que, com uma distribuição mais justa e equilibrada dos dinheiros públicos no território continental, esse desenvolvimento não se tivesse conseguido, como também nada garante que, com a criação de poderes regionais no Continente, os mesmos venham a ser, automaticamente, tão eficazes como os das Regiões Insulares. Creio mesmo que não será apenas pela falta de meios financeiros (que até têm existido, canalizados pelas actuais C. C. D. R.'s) que as Regiões do Interior persistem no seu atraso. Mas apesar disto é óbvio que a criação de Regiões Administrativas no Continente dará sempre um impulso, maior ou menor, ao desenvolvimento do Interior.

No entanto, ele poderia igualmente ser obtido a partir de políticas adequadas de desenvolvimento regional levadas a cabo pelo Governo Central, o que contudo ainda nunca foi experimentado em Portugal, por razões que ultrapassam a questão do centralismo. O que não pode mesmo ser obtido sem a Regionalização é, porém, a satisfação do princípio democrático da SUBSIDIARIEDADE, no qual se fundamenta aliás a construção europeia, que estabelece que, por imperativos de transparência e JUSTIÇA da vida democrática, uma decisão que possa ser convenientemente tomada num determinado nível não DEVE subir a um nível superior de decisão! Trata-se, portanto, de uma questão do foro eminentemente político. Mas cuja solução terá, por seu turno, de ser essencialmente de carácter técnico (o que, de um modo geral, irrita profundamente os nossos políticos, e ESTA É QUE É, quanto a mim, A VERDADEIRA QUESTÃO!).

Não me parece que exista qualquer consenso actualmente na Sociedade portuguesa quanto a este assunto, antes pelo contrário, pelo simples facto de ainda ninguém ter sido convenientemente esclarecido sobre a matéria, POR CULPA EVIDENTE DA CLASSE POLÍTICA, que não começou sequer a preocupar-se em discuti-lo, seriamente. Mas nunca é tarde, por isso eu me bato por que se inicie, quanto antes, um novo debate público sobre esta problemática, mas desta vez mais esclarecido e menos apaixonado, e que de uma vez por todas a transporte para o domínio da lógica e da racionalidade, eliminando os mitos e receios com que tem sido intoxicada, deliberadamente, a opinião pública, para que, TÃO BREVE QUANTO POSSÍVEL (e estou esperançado de que o novo Primeiro-Ministro José Sócrates consiga trazê-la para a agenda das próximas Legislativas), seja implementada "em concreto" (como dizem, cinicamente, os constitucionalistas...), a tão esperada Regionalização.

Que não vai resolver os problemas, por milagre, mas pelo menos poderá contribuir para tornar mais transparente a nossa vida pública, e também mais consentânea com a realidade (banal) dos Países nossos parceiros na União Europeia (pelo menos dos 15), evitando assim o contínuo alheamento e distanciamento dos cidadãos face à política.

Só mais duas achegas: não considero indispensável a realização de um novo Referendo sobre o assunto! Trata-se de matéria constitucional já consagrada e sem qualquer discussão (à altura). O Referendo só deverá realizar-se como mero reforço do que a Constituição já determina (e também porque, desgraçadamente, houve o tal outro, tão mal conduzido...) e, quanto a mim, partindo do princípio de que a população está adequadamente esclarecida sobre o assunto e também na condição óbvia de, caso mesmo assim volte a haver um NÃO, sejam levadas até ao fim as suas consequências políticas, ou seja, como é da mais elementar justiça (já o era EM 1997!!), e porque nunca o Povo foi antes consultado sobre as mesmas, SEJAM NATURALMENTE EXTINTAS AS REGIÕES AUTÓNOMAS DOS AÇORES E DA MADEIRA!!

Segundo, o modelo de Regionalização do Continente não deverá ser, em rigor, idêntico ao das Regiões Insulares, por nada justificar, nesse caso, o epíteto de "Autónomas" que estas ostentam. Porque, na realidade, no Continente as Regiões deverão ser apenas Administrativas, evitando-se assim a conotação vincadamente "desagregacionista" do termo "Autónomas" (que só os muito especiais condicionalismos geográficos dos Arquipélagos justificam), isto é, verdadeiras Autarquias Locais de nível Regional, com meios, competências e poderes tipificados, intermédios entre as estruturas governamental e municipal (e clarificando de uma vez por todas a questão das Juntas de Freguesia, as quais, no enquadramento legislativo actual, talvez por preguiça ou justificado cansaço ou esgotamento intelectual do eminente Legislador, foram tratadas como vagamente dependentes do nível municipal, relegadas que estão para uma forma quase residual de Administração Pública...).

Voltarei brevemente ao assunto, mas não quero deixar, mais uma vez, de recomendar desde já a leitura do notável artigo de Jorge Cordeiro, «Os Caminhos Ínvios da "Descentralização"», publicado na Revista «PODER LOCAL», no número 144 (de Jan./Jun. de 2 004) e, igualmente, a consulta do "blogue" do prof. Vital Moreira, um dos constitucionalistas mais coerentes e esclarecidos sobre este assunto e regionalista não só convicto, como experiente: www.causanossa.blogspot.com.

INJUSTIÇA FISCAL, DÉFICE ORÇAMENTAL E A NECESSIDADE DE UM IMPOSTO SOBRE AS GRANDES FORTUNAS PORTUGUESAS

(Nota: apesar de citados e comentados, os Quadros enviados pelo Autor não foram inseridos, para simplificação da leitura)

Neste momento, utilizando os grandes órgãos de informação, a que têm acesso fácil, os defensores do pensamento económico de cariz neo-liberal procuram criar a ideia, ao nível da opinião pública, de que é necessário e mesmo inevitável aumentar os impostos indirectos (IVA, IA, ISP) em Portugal. Mas isso não é verdade, como provamos neste estudo, utilizando apenas dados oficiais.

Assim, contrariamente ao que muitas vezes se afirma ou pretende fazer crer, a carga fiscal em Portugal não é a mais elevada da União Europeia. De acordo com dados publicados pelo «Eurostat», em 2003 a carga fiscal representava em Portugal 38,1% do PIB, enquanto a média na União Europeia rondava os 41,6%. O que é mais elevado em Portugal é o peso dos Impostos Indirectos, que são os impostos mais injustos, porque não atendem ao rendimento do contribuinte (pobres ou ricos, quando adquirem o mesmo maço de cigarros pagam a mesma importância de imposto). Em 2003, as receitas que tiveram como origem os impostos indirectos representaram em Portugal 41,9% das receitas fiscais do Estado, quando a média na União Europeia foi apenas de 33,8% do PIB (quadro I). Depois de 2003, esta situação agravou-se mais em Portugal, pois em 2005 em cada 100 euros de receitas fiscais, 62,3 terão como origem impostos indirectos (ver Quadro II).

Mesmo a nível dos Impostos Directos, que são impostos mais justos, pois atendem, em princípio, ao rendimento dos contribuintes, a injustiça tem aumentado em Portugal. Em 2002, em cada 100 euros de receitas de impostos directos, 63,3 euros tinham como fonte o IRS, enquanto o IRC, pago pelas empresas, contribuía apenas com 35,9 euros. Em 2005, em cada 100 euros de receitas fiscais com origem em impostos directos, 70,3 euros terão como origem o IRS e apenas 27,8 euros o IRC pago pelas empresas (Quadro III).

A nível do IRS a injustiça fiscal é também assustadora. Em 2003, por ex., 87,5% dos rendimentos declarados eram rendimentos do trabalho por conta de outrém e de pensões de reforma. Os rendimentos auferidos por pessoas singulares de empresas, profissões liberais, rendimentos de capitais, rendimentos prediais, mais valias, etc., representavam apenas 12,5% do total de rendimentos declarados naquele ano para efeitos de pagamento de IRS (Quadro IV).

Entre 2001 e 2003, o número de contribuintes que declararam rendimentos superiores a 250.000 euros por ano diminuíu de 26.802 para apenas 2.144 , o que indicia um forte aumento da evasão e fraude fiscal, feito perante a passividade dos sucessivos governos (Quadro V).

Só no período compreendido entre 2001 e 2003, o Estado perdeu receitas que têm como origem o IRC, devido aos benefícios fiscais concedidos às empresas, assim como à possibilidade que estas têm de deduzir, nos anos em que têm lucros, os prejuízos de anos anteriores, cerca de 5.020 milhões de euros (o que correspondente a mais de 1.000 milhões de contos). Uma redução dos benefícios e uma limitação significativa dos prejuízos que podem ser deduzidos pelas empresas determinaria um acréscimo importante de receitas fiscais do Estado, que contribuiria para reduzir o défice orçamental (Quadro VI).

Em Portugal, de acordo com um estudo divulgado pelo INE, os 10% mais ricos da população apropriam-se de 29% do rendimento do País, enquanto 50% da população portuguesa recebe apenas 24% do rendimento do País. Um imposto sobre as grandes fortunas, à semelhança do que já existe em França e no Luxemburgo, lançado temporariamente sobre os 10% da população mais rica, permitiria obter uma receita que contribuiria também para reduzir o défice orçamental.

Um combate eficaz, e não apenas mediático, contra a evasão e a fraude fiscais, que a própria Administração Fiscal reconhece situarem-se entre os 4% e os 7% do PIB (nós estimamos em 10% do PIB), permitiria obter um importante acréscimo de receitas fiscais.

A proposta defendida pelos defensores do pensamento económico de cariz neo-liberal, de aumento dos impostos indirectos, agravaria ainda mais a já grave injustiça fiscal existente no nosso País e violaria o n.º 1 do Art.º 103º da Constituição da República Portuguesa. As propostas que apresentamos provam que existem outras soluções para aumentar as receitas fiscais, as quais não determinariam um aumento da carga fiscal para as classes trabalhadoras e que respeitariam o preceito constitucional. Fazemos votos para que, desta vez, o Sr. Presidente da República não se esqueça de que o sistema fiscal visa não só a satisfação das necessidades financeiras do Estado, mas também “uma repartição mais justa dos rendimentos e da riqueza”, como estabelece a Constituição da República, e que explique isso principalmente aos mais ricos e ao Governo.

A questão do défice orçamental e a forma de o “resolver” está-se a transformar novamente na questão central que domina os órgãos de informação e arrisca-se a condicionar a política económica e social futura, com consequências graves para o futuro dos portugueses.

Contrariamente àquilo que afirmam os defensores do pensamento económico de cariz neo-liberal (Vítor Constâncio, Medina Carreira, Eduardo Catroga, Hernâni Lopes, etc.), cujas opiniões são reproduzidas e repetidas até à exaustão pelos media, o problema mais grave que Portugal enfrenta neste momento não é o problema do défice orçamental. Este é apenas um sintoma (ponta do “iceberg”) de problemas mais graves que enfrenta a Economia Portuguesa, fruto de políticas económicas erradas levadas a cabo pelos diferentes Governos que se têm sucedido, de uma forma pendular, ao longo dos anos (recorde-se, a este propósito, o papel de Pina Moura que, agora instalado no Concelho de Administração da multi-nacional espanhola "Iberdrola", não se cansa de dar conselhos). Transformar o problema do défice no problema central da economia portuguesa, subordinando-se tudo a ele, é condenar Portugal ao atraso e a uma crise mais profunda e duradoura. A experiência dos últimos anos e a situação actual da Economia Portuguesa provam isso.

No entanto, neste estudo não vamos analisar esse problema (ficará para um outro), mas sim as implicações das “propostas milagrosas”, insistentemente apresentadas pelos defensores do pensamento económico único dominante, para aumentar as receitas e que se traduzem, pura e simplesmente, em aumentar os impostos indirectos (IVA, IA e Imposto sobre os Combustíveis), sem olhar às consequências sociais - e também económicas - do agravamento das desigualdades que tal medida implicaria. E é importante desmontar e denunciar tal manobra até porque, sendo repetida até à exaustão pelos media como está a suceder, o que se procura é torná-la inevitável.

PORTUGAL É O PAÍS DA UNIÃO EUROPEIA COM UMA ESTRUTURA DE CARGA
FISCAL JÁ EXTREMAMENTE INJUSTA

Observem-se os dados do Quadro I, que são dados oficiais do serviço de estatística da União Europeia, divulgados em 2005, sobre a estrutura fiscal portuguesa e a média da União Europeia.
(Quadro 1 – Estrutura da carga fiscal média na União Europeia e em Portugal)

FONTE: Eurostat, Communiqué de presse, 15/2005, 28.1.2005
A primeira conclusão que se tira dos dados oficiais divulgados pelo «Eurostat» é que, contrariamente, ao que insistentemente se ouve nos media em Portugal, o nosso País não tem a carga fiscal mais elevada da União Europeia. E tenha-se presente que é precisamente com base nesta afirmação, que é falsa, que depois se afirma que Portugal não é competitivo em termos fiscais. Efectivamente, os dados do «Eurostat» constantes do quadro anterior provam que a carga fiscal portuguesa, medida em percentagem do PIB, ou seja, em percentagem da riqueza criada no País, rondava, em 2003, os 38% do PIB, estando assim abaixo da média europeia, que se situava entre os 41,6% (UE/25) e os 42,2% do PIB (zona "Euro", a que Portugal também pertence).

Os dados do «Eurostat» mostram que é sistematicamente esquecido nos media, em Portugal, que a estrutura da carga fiscal existente no nosso País é muito mais injusta do que a estrutura da carga fiscal média dos países que constituem a União Europeia. Para concluir isso é preciso ter presente o que significam, sob o ponto de vista de equidade fiscal, os impostos directos e os impostos indirectos.

Isto porque os primeiros – os Impostos Directos – atendem ao rendimento auferido por cada contribuinte. Quanto mais elevado é o rendimento, maior é o imposto pago ao Estado. Por ex., a nível do IRS, quanto mais elevado é o rendimento, maior é a percentagem de imposto que se tem de pagar ao Estado.

Em relação aos Impostos Indirectos isso não acontece. Seja qual for o rendimento do contribuinte, ele paga sempre o mesmo imposto (em euros) ao Estado. Por ex., um contribuinte que receba o salário mínimo nacional, quando adquire um maço de cigarros paga o mesmo imposto (em euros) que é pago por um contribuinte que adquira o mesmo maço de cigarros, mas cujo rendimento mensal seja dez vezes superior ao salário mínimo nacional.

Os dados do «Eurostat» constantes do Quadro I mostram o seguinte: – Em 2003, por ex., em Portugal, os impostos directos (os impostos mais justos) contribuíam apenas com 24,6% das receitas fiscais do Estado, enquanto a média na União Europeia se situava, no mesmo ano, entre 29% (zona do euro ) e 32,2% (UE/15, a que Portugal sempre pertenceu). Pelo contrário, os Impostos Indirectos, portanto os impostos mais injustos sob o ponto de vista de equidade fiscal, contribuem em Portugal com 41,9% das receitas fiscais do Estado, enquanto a média na União Europeia se situa entre os 32,8% (Zona "Euro") e 33,8% (UE/25).

Em resumo, a estrutura fiscal portuguesa já era em 2003 uma das mais injustas de toda a União Europeia. E essa situação não tem parado de se agravar, como provam os dados oficiais do Quadro II, que se apresenta seguidamente.

(Quadro II – Evolução do peso dos Impostos Directos e dos Impostos Indirectos em Portugal)
FONTE: 2002 - Relatório OE/2003, pág. 51; 2003 - Relatório OE/2004, pág. 60; 2004 e 2005 - Relatório OE/2005, pg.51

Como mostram os dados do quadro anterior, em 2002, em cada 100 euros de receitas fiscais, 58,2 euros tiveram como origem os impostos indirectos e apenas 41,8 euros os impostos directos; em 2005, essa situação já é muito mais grave, pois em cada 100 euros de receitas fiscais 62,3 euros têm como origem impostos indirectos e apenas 37,7 euros impostos directos!!

Isto determina que seja precisamente a maioria da população, constituída pelos trabalhadores, que tenha de contribuir, e de uma forma crescente, mais para as receitas fiscais do Estado. E as propostas dos defensores do pensamento de cariz neo-liberal, como Medina Carreira, Rogério Fernandes Ferreira e outros, é aumentar ainda os impostos indirectos de uma forma geral e sem qualquer critério (falam em aumentar o IVA para 21% e mesmo 22% “esquecendo” que quem iria pagar mais uma vez esse aumento seriam principalmente os trabalhadores).

DESIGUALDADES CRESCENTES MESMO NOS IMPOSTOS DIRECTOS: Receita de IRS cresce, receita de IRC diminui

Mesmo dentro dos impostos directos, que são aqueles que em princípio são mais justos, a política que tem sido seguida nos últimos anos está a criar graves injustiças.

Os dados do quadro seguinte, que são dados constantes dos Relatórios que têm acompanhado as Proposta de Orçamento de Estado, mostram o que se tem registado na área dos impostos directos.

(Quadro III – Evolução do peso do IRS e do IRC nas receitas dos Impostos Directos)
FONTE: 2002 - Relatório OE/2003, pág. 51; 2003 - Relatório OE/2004, pág. 60; 2004 e 2005 - Relatório OE/2005, pg.51.

Em 2003, de cada 100 euros de impostos directos arrecadados pelo Estado, 63,3 euros tinham como origem o IRS e, em 2005, em cada 100 euros já 70,3 euros terão como origem o IRS, ou seja, um crescimento de 11,1%! E como se sabe o IRS é pago fundamentalmente pelos trabalhadores.

Enquanto isso sucede a nível de IRS, as receitas que têm como origem o IRC, pago pelas empresas, não têm parado de descer. Em 2002, apenas 35,9 euros em cada 100 euros de impostos directos tiveram como origem o IRC e, em 2005, serão apenas 27,8 euros cada 100, ou seja, uma diminuição de 22,6%.

Como consequência da política de favorecimento das empresas sobrecarregando fundamentalmente os rendimentos do trabalho, a injustiça mesmo a nível dos impostos directos cresceu de uma forma impressionante!!!

A NIVEL DO IRS, 87,5% DOS RENDIMENTOS DECLARADOS SÃO DE TRABALHADORES POR CONTA DE OUTRÉM E DE REFORMADOS

O IRS incide sobre todo o tipo de rendimentos auferidos por pessoas singulares, sejam rendimentos do trabalho, de pensões de reforma, de prédios, de empresas, de aplicações de capitais, de mais-valias, etc. . Como mostram os dados do Quadro IV, são os trabalhadores por conta de outrém e os reformados que pagam a maior parte do IRS, pois as outras categorias de rendimentos continuam a fugir impunemente ao pagamento deste imposto.

(Quadro IV – Distribuição do rendimento declarado para efeitos de IRS por categorias de rendimento - Ano 2003)

FONTE: DGCI- Ministério das Finanças

Como mostram os dados do quadro anterior, 87,5% dos rendimentos declarados são dos trabalhadores por conta de outrém e de reformados. As outras categorias de rendimento – empresariais, profissionais livres, de capitais, prediais e incrementos patrimoniais, que inclui as mais valias - representam apenas 12,5% dos rendimentos declarados para efeitos de IRS. Como mostram também os dados do quadro anterior, cada titular de rendimento de trabalho dependente (trabalhador por conta de outrém) declarou, em média, 11.350 euros; cada titular de uma pensão declarou, em média, 8.506 euros; mas já cada titular de rendimentos de empresa ou profissional livre declarou somente 6.022 euros (501 euros por mês), etc. . É um autêntico escândalo nacional esta situação, que se está a eternizar!!!!

EM TRÊS ANOS APENAS, O NÚMERO DE TITULARES COM RENDIMENTOS SUPERIORES A 250.000 EUROS DIMINUÍU 12,5 VEZES!!!!!

Em relação aos rendimentos mais elevados sujeitos a IRS – escalão superior a 250.000 euros – o quadro seguinte revela o escândalo verificado nos últimos anos, o que só contribui para agravar as desigualdades no seio dos próprios impostos directos.

(Quadro V - Evolução do número de titulares e do rendimento declarado para efeitos do IRS pelos possuidores de grandes fortunas em Portugal)

FONTE: DGCI/DGITA, Novembro 2004 - Ministério das Finanças

De acordo com os dados do Ministério das Finanças constantes do quadro anterior, entre 2001 e 2003, o número de pessoas que declararam rendimentos superiores a 250.000 euros para efeitos de IRS diminuíu de 26.802 para apenas 2.144 (em 2001, eram 0,7% do total de agregados e, em 2003, já representavam apenas 0,1%). Por outro lado, o valor dos rendimentos declarados diminuíu de 4.502 milhões de euros para apenas 1.047 milhões de euros, o que determinou que, em 2001, representasse 7,5% dos rendimentos totais declarados para efeitos de IRS e, em 2003, apenas 1,7% do total. Parece pacífico que esta quebra evidencia um aumento impressionante da fraude e evasão fiscal, o que só agrava ainda mais a injustiça fiscal. No entanto, até esta data não se conhece qualquer indício de que esta situação está a mudar, ou vai mudar.

EM 3 ANOS APENAS, O ESTADO PERDEU 5.020 MILHÕES DE RECEITA DE IRC DEVIDO AOS BENEFÍCIOS FISCAIS E À DEDUÇÃO DOS PREJUÍZOS NOS LUCROS!

O quadro seguinte, construído com dados divulgados pelo Ministério das Finanças, mostra bem que a política fiscal seguida em Portugal tem continuado a beneficiar muito as empresas, nomeadamente as grandes empresas.

(Quadro VI - Cálculo da receita de IRC perdida pelo Estado no período 2001-2003 devido aos benefícios fiscais concedidos às empresas)

FONTE: DGCI/DGITA - Ministério das Finanças


Como mostram os dados do quadro anterior, no período compreendido entre 2001 e 2003, as empresas que apresentaram lucros (e tenha-se presente que em 2003, por ex., das 331.528 empresas que apresentaram declarações de IRC, 161.801 - ou seja, 49 em cada 100 -, ou apresentaram prejuízo ou lucro zero!!), ou melhor, os lucros apresentados pelas Empresas no período 2001-2003 somaram 55.867 milhões de euros. No entanto, não foi sobre todos estes lucros que foi calculado o IRC a pagar pelas Empresas. Antes de se aplicar a taxa de IRC, foram deduzidos, nos resultados das empresas , os benefícios fiscais e os prejuízos que tiveram em anos anteriores que, de acordo com o art.º 47º do Código do IRC, podem ser deduzidos nos seis anos seguintes, e que somaram 18.467 milhões de euros, como consta também do quadro anterior. Em seguida, calculou-se o IRC, mas ainda não é este valor que a empresa tem de pagar. Ainda há outras importâncias a deduzir, nomeadamente benefícios fiscais agora não no rendimento mas sim ao imposto que, no período considerado, somaram 403 milhões de euros como consta do quadro anterior!

Como consequência de todos estes benefícios concedidos às empresas, assim como da possibilidade de deduzir, nos lucros de um ano, os prejuízos que tiveram nos seis anos anteriores, o Estado perdeu, só no período 2001-2003, cerca de 5.020 milhões de euros de receitas (o equivalente a mais de 1.000 milhões de contos!!!). Bastaria anular estes benefícios ou, pelo menos, uma parte significativa deles, para se obter uma redução importante do défice orçamental!! Mas esta hipótese não passa pelas mentes iluminadas dos defensores do neo-liberalismo que hoje dominam os media e igualmente os meios oficiais em Portugal.

A CRIAÇÃO DE UM IMPOSTO SOBRE AS GRANDES FORTUNAS

Portugal é o país da União Europeia onde são maiores as desigualdades! Segundo dados do «Eurostat», os 20% da população mais ricos recebem 6,5 vezes mais rendimentos do que os 20% mais pobres, quando essa relação é, em média, de 4,4 vezes em toda a União Europeia. Por outro lado, de acordo com um estudo divulgado pelo INE, os 10% da população mais ricos apropriam-se de 29% de todo o rendimento disponível, enquanto os 50% da população mais pobres recebem apenas 24% do rendimento.

Segundo o Banco de Portugal, em 2003 o rendimento disponível em Portugal atingiu os 91.520 milhões de euros. Admitindo um crescimento anual de 3% ao ano, que está próximo do verificado em anos anteriores, estima-se para 2005 um valor que deverá rondar os 97.000 milhões de euros.

Daquele rendimento disponível, os 10% mais ricos em Portugal devem-se apropriar de mais de 28.130 milhões de euros, recebendo os 50% da população portuguesa mais pobres apenas 23.280 milhões de euros.

Em França e no Luxemburgo, por ex., existe já um imposto sobre as grandes fortunas, que ronda os 5 por mil. Um imposto desta natureza deveria ser aplicado àqueles 10% mais ricos cujo rendimento é superior ao recebido por 50% da população portuguesa, ainda que transitoriamente, ou seja, apenas durante o período necessário para se resolver o problema do défice orçamental. Desta forma, evitar-se-ia sobrecarregar ainda mais as classes de mais baixos rendimentos, agravando as desigualdades existentes que já são enormes, como inevitavelmente acontecerá se for posta em prática a “solução” apresentada pelos defensores do pensamento único de cariz neo-liberal, que consiste em aumentar ainda mais os impostos indirectos, ou seja, o IVA, o IA e o ISP. E isto porque estes impostos, por não atenderem ao rendimento de cada contribuinte, agravam ainda mais injustiça fiscal que já existe em Portugal, como mostramos neste estudo utilizando apenas dados oficiais do «Eurostat» e do Ministério das Finanças.

Para além disso, as soluções que defendemos para aumentar a receita – diminuição dos benefícios fiscais às empresas; diminuição significativa da possibilidade de deduzir nos lucros de um ou vários anos os prejuízos que as empresas tiveram em anos anteriores (só entre 2001 e 2003, as empresas em Portugal acumularam 25.148 milhões de euros de prejuízos que pretendem deduzir nos lucros dos anos seguintes, o que representará, a verificar-se, uma elevada perda de receita fiscal para o Estado); e a criação de um imposto sobre as grandes fortunas, à semelhança do que já existe em outros países europeus –; repetindo, para além destas soluções, também defendemos um combate eficaz, e não apenas "mediático", à fraude e à evasão fiscais que fazem perder um volume de receita anual ao Estado que estimamos em cerca de 10% do PIB (o Ministério das Finanças já reconhece que se situa entre os 4% e os 7%, o que significa entre 5.400 milhões de euros e 9.450 milhões de euros, que é já um valor impressionante)!!

É também evidente que as propostas que defendemos respeitam o n.º 1 do Art.º 103º da Constituição da República Portuguesa, que estabelece o seguinte: “O sistema fiscal visa a satisfação das necessidades financeiras do Estado e uma repartição justa dos rendimentos e da riqueza”.

Pelo contrário, o aumento dos impostos indirectos, como defendem os defensores do pensamento económico de cariz neo-liberal, não determinaria uma repartição justa dos rendimentos e da riqueza, como ficou claro neste estudo.

Eugénio Rosa
Economista
edr@mail.telepac.pt
Tel 91 7576313
21 de Maio de 2005
(Nota do Editor: Por motivo do atraso na edição deste Artigo, os seus considerandos encontram-se já desactualizados, dada a decisão governamental de avançar com o aumento do I. V. A., de 19 para 21%...)