sexta-feira, maio 11, 2007

REGIONALIZAÇÃO E NOVOS CENTRALISMOS

O exemplo da Beira

Um dos vários fantasmas que por vezes se associam à Regionalização é a alegada possibilidade de se virem a criar novas “mini-Lisboas”, a partir das futuras sedes regionais.

Aponta-se esse risco sobretudo em relação à suposta “dominação” do Norte pelo Porto, mas o mesmo aparece por vezes também referido a propósito de Viseu, ou de Aveiro, face a uma indesejada “submissão” a Coimbra.

Não é habitual, contudo, acenar com este fantasma no Algarve, ou mesmo na Região mais extensa do País (o Alentejo), felizmente. Penso que isso estará porventura relacionado com a maior facilidade de deslocação nestas duas Regiões, relativamente ao que acontece no Centro e Norte de Portugal.

Partindo do princípio que se trata de um temor real e a ter em conta, como evitar então que os malefícios de um exagerado centralismo sejam transferidos para a arquitectura do futuro poder regional?

O problema não é original. Esteve igualmente bem presente na escolha até de algumas Capitais de Países, como por exemplo a Espanha (que preferiu Madrid – à altura uma pequena Cidade sem tradições medievais –, por uma questão de centralidade e de neutralidade entre os poderes precedentes, no caso os Reinos de Castela e de Aragão), os Países Baixos (a pequena Haia em vez de Amesterdão), a Austrália (Camberra em lugar de Sidney), os E. U. A. (Washington e não a megalópole nova-iorquina), a R. F. A., antes da unificação alemã (Bona), e o próprio Brasil, que preferiu mesmo construir uma Capital totalmente de raiz!

Mas também organizações como a ONU e a própria CEE enfrentaram este dilema, tendo optado por uma via diferente: a da desconcentração. Sede em Nova Iorque e algumas dependências em Genebra, no primeiro caso, Comissão Europeia em Bruxelas e Parlamento Europeu em Estrasburgo (mais o Banco Central Europeu, suponho que na Alemanha), no segundo.

A escolha das futuras sedes regionais em Portugal estará condicionada por três factores principais:

1º – a necessidade de concentração, por razões económicas e de eficácia operacional;

2º – a (oposta) necessidade de desconcentração, por motivos de proximidade dos problemas e dos Cidadãos (mais sensíveis nas tais regiões menos permeáveis às comunicações terrestres), e

3º – a (concorrente com a primeira) evidência da implantação actual das cinco Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (C. C. D. R.’s), no Porto, em Coimbra, em Lisboa, em Évora e em Faro.

Numericamente, são duas a favor e uma contrária à concentração. Em termos políticos, no entanto, e tendo a Regionalização como objectivo e móbil primordial a descentralização administrativa, fará todo o sentido conferir à necessidade de desconcentração uma ponderação especial, em prol da coerência e credibilidade desta tão vasta e estrutural reforma.

Tomando como exemplo a Beira (também chamada Região Centro, numa perspectiva onomástica mais fria e tecnocrática), mas podendo generalizar-se o raciocínio a qualquer outra Região, parece-me que uma boa solução terá sempre que, pelo menos de início, equilibrar estes dois vectores estruturantes: o da concentração e racionalização de meios, por um lado, e o da descentralização, por outro.

Devo notar que, nesta asserção de descentralização, estou a conter-me no estrito sentido da multiplicação de localizações num mesmo nível administrativo, sem perdas do poder de decisão centralizado. Ao contrário da descentralização inerente à própria criação das Regiões em si, que por definição envolve a perda de poder de decisão por parte dos níveis de poder político pré-existentes (Central e Autárquico).

Nesta perspectiva, existem duas formas de descentralizar, sem perda de poder de decisão: pela desconcentração, em que os órgãos regionais estão todos localizados na Sede regional, mas possuindo sub-delegações distribuídas pelo território da Região (à semelhança dos organismos do Governo), ou pela deslocalização, ou dispersão, pela qual são os próprios órgãos regionais que não se encontram todos localizados na Sede regional (no limite, poderia nem haver Sede, ou Capital, regional!).

Sem querer abordar aqui a questão de, numa óptica centralizadora, saber se a Capital da Beira deverá ser Coimbra ou outra qualquer localidade da Região, pretendo apenas contribuir para uma reflexão serena sobre possíveis modelos de solução que equilibrem as duas vertentes, a “centralista” (mais económica e eficiente) e a “descentralizadora” (mais defensável e mobilizadora ao nível popular, se bem que correndo o risco de passar por demagógica).

Partindo então do princípio de que a “Sede regional” (designação que nem sequer é necessária) ficará, muito naturalmente, em Coimbra (mas podendo à partida ser em qualquer outra localização central na Região, como Tondela, etc.), uma primeira hipótese de efectiva descentralização consiste em separar os dois órgãos de topo da Administração Regional. Como? Colocando, apenas a título de exemplo, a Assembleia Regional em Coimbra e a Junta Regional em Leiria (ou em Mangualde, ou na Sertã, ou…), ou vice-versa. Como está consagrado na referida solução para a União Europeia.

Complementarmente, os futuros “serviços técnicos e administrativos” da Região, mais ligados à Junta (detentora do poder executivo), poderão ou estar concentrados e possuir sub-delegações, ou então estar dispersos pelo território regional.

Na primeira hipótese, seriam talvez suficientes sub-delegações, com qualidade e estrutura semelhantes, nas actuais Capitais de Distrito – Coimbra, Aveiro, Viseu, Guarda, Leiria e Castelo Branco (partindo do princípio, improvável, de que a Junta Regional não se localizaria em nenhuma destas Cidades).

Na hipótese da deslocalização (que poderia até acontecer apenas com alguns dos serviços), seriam os próprios "departamentos" que procurariam, no seu todo, a localização mais desejável em função das suas atribuições específicas. Exemplos possíveis: Licenciamento Urbanístico e Transportes em Leiria; Turismo e Pescas na Figueira da Foz; Ambiente e Parques Naturais na Covilhã; Saúde, Ensino e Investigação em Coimbra, ou Aveiro; Cultura e Desporto em Viseu; Agricultura, Silvicultura e Cinegética na Guarda; Indústria em Aveiro, ou Castelo Branco; Energia em Pinhel; Protecção Civil em Lamego, ou Arganil; etc.…

Uma solução deste tipo, desde que economicamente racionalizada (com base numa estrutura leve, eficiente, informatizada e muito profissional), poderia de facto impulsionar o desenvolvimento poli-nucleado da Beira, ancorado nesta rede de centros urbanos com funções administrativas regionais, optimizando os recursos e os investimentos públicos e enquadrando o próprio investimento privado.

Obviamente, caberá aos principais destinatários destas reflexões – os eleitores da Região Centro – encontrarem a melhor forma de tornarem todas as possíveis hipóteses de trabalho em realidades palpáveis e satisfatórias, numa perspectiva de consenso informado, mas não paralisado pelo medo de experimentar. Porque nada do que for instituído de início ficará inibido de poder, com o tempo, ir sendo aperfeiçoado com base no acumular das experiências concretas…

terça-feira, maio 08, 2007

COMBATER O DESPOVOAMENTO DO INTERIOR


1 – A ABORDAGEM DO PROBLEMA

Outro dia, no conhecido “Fórum TSF”, discutia-se muito acaloradamente este tema. Claro que, dado o vulgar superficialismo e simplismo dos meios de comunicação ditos “de massas”, é difícil aquilatar da vantagem real destes debates para a promoção de um maior esclarecimento público sobre o assunto… Mas, em todo o caso, já é bastante positivo abordar-se um tema como este num programa de tão vasta audiência (segundo creio).

Convém, contudo, não deixar passar sem resposta algumas lacunas e imprecisões que, infelizmente, ainda persistem na “ideia geral” que a opinião pública demonstra ter sobre estas matérias, caindo com demasiada frequência em ideias feitas, geralmente muito “mediáticas”, mas totalmente estranhas não só à realidade, como ao que é o conhecimento técnico e científico actual sobre estas matérias (e estranhas, tantas vezes, até ao mais comezinho bom senso…).

Para “ajudar” ainda mais à visão limitada e subjectiva sobre o assunto que ficou do referido programa, a excessiva e notória preocupação com entrevistas a múltiplos Presidentes de Câmara (que acabaram até por monopolizar a maior parte do programa!), como se estes protagonistas tivessem mais alguma coisa de relevante a transmitir sobre esta questão, ou até poder para alterar o que quer que seja neste domínio!…

Outra confusão absurda e muito entranhada (tanto na opinião pública como na classe jornalística) consiste na recorrente identificação entre “Ordenamento do Território” e “Desenvolvimento Regional”. Nada, porém, que uma consulta a um bom especialista do tema não conseguisse esclarecer devidamente, mas os jornalistas portugueses fogem do Saber com tanta rapidez e convicção quanto são atraídos pelos detentores do Poder! É o que temos, mas é pena…

Sobre esta última questão, bastará recordar os exemplos de bom ordenamento em regiões muito pobres (todo o Interior Sul de Portugal!), de mau ordenamento em regiões desenvolvidas (Linha do Estoril, Litoral algarvio), assim como há também, naturalmente, mau com mau e bom com bom (felizmente ainda vai restando alguma coisa…). Pois se são conceitos tão distintos!…

Mas avancemos para o cerne da questão: a morte anunciada das Aldeias do Interior e o progressivo despovoamento de vastas áreas do nosso território continental, que todos lamentamos.

Tendência persistente de há décadas, unanimemente reconhecida e comprovada, julga-se contudo de um modo geral (tão ingénuo…) que poderia ser invertida, mais ou menos rapida e eficazmente, com “pacotes de medidas” políticas, sobretudo se oriundas do Poder Central (qual fonte milagreira…)! E para isso “bastaria” que o Governo “se preocupasse” com o problema, segundo os nossos ilustres autarcas… Mas será que as coisas são mesmo assim?

Evitar o despovoamento do Interior do País será mesmo ressuscitar o velho Mapa de Portugal que conhecemos das escolas primárias, aquele das velhas Cidades, Vilas, Aldeias e Lugares da nossa memória colectiva? Parece-me claro que não! Vejamos porquê.


2 – A ORIGEM DO POVOAMENTO ACTUAL

Todos sabemos que o povoamento actual do País está intimamente relacionado com a sua estrutura económica. Para falarmos claro e para que todos compreendam (o excesso de erudição é também uma das formas mais eficientes de perpetuar a ignorância popular!), o mapa de Portugal do Séc. XX (digamos até aí há uns trinta anos), que era muito semelhante ao dos Séc.s XVIII e XIX (à excepção de Lisboa e Porto), traduzia expressivamente a grande predominância da AGRICULTURA, na economia e na Sociedade, até à geração que nos precedeu.

As pessoas moravam predominantemente em aglomerações urbanas localizadas tendo como critério principal recursos como a água e com dimensões economica e fisicamente viáveis, dispostas no território segundo um padrão geográfico que permitisse aos trabalhadores agrícolas e pastores chegarem ao local de trabalho A PÉ E EM TEMPO ÚTIL, para uma jornada laboral que, como se sabe, se estendia quase sempre do nascer ao pôr do Sol!

As Vilas e, sobretudo, as Cidades só começaram a expandir-se com o advento da Industrialização que, como é conhecido, em Portugal se realizou de uma forma tardia, incompleta e muito heterogénea em termos territoriais.

Com a moderna terciarização e o subsequente desenvolvimento extraordinário das comunicações e das infra-estruturas de transporte, PARA JÁ NÃO FALAR NA historicamente precedente MECANIZAÇÃO DA AGRICULTURA, o modelo de povoamento tradicional FOI DEFINITIVAMENTE POSTO EM CAUSA, como se pode comprovar analisando o que sucedeu aos nossos vizinhos mais próximos.


3 – OS ERROS DE DIAGNÓSTICO

Deve pois concluir-se, urgentemente, que O MODELO DE POVOAMENTO ANCORADO EM VILAS, ALDEIAS E LUGARES, mais ou menos densos e claramente separados entre si, SÓ TEM VIABILIDADE NO TIPO DE ECONOMIA TRADICIONAL, BASEADO NUMA AGRICULTURA DE SUBSISTÊNCIA! É pois totalmente quixotesco insistir na ilusão de que, no futuro, o combate à desertificação do Interior passará pela salvação deste modelo de povoamento!

Dito isto, é também imperioso reconhecer que a referida desertificação nunca poderá ser resolvida com medidas conjunturais e de legislatura, antes exigindo um compromisso político muito vasto, caucionado pelos eleitores e que condicione efectivamente os governantes a uma orientação estratégica nesse sentido durante muitos governos consecutivos (se é que ainda vamos a tempo)!

Terceira conclusão decisiva: não são as autoridades locais quem pode resolver o problema, mas sim o Estado, através da sua política nacional, e futuramente as autoridades regionais, num âmbito de acção menos vasto mas, ainda assim, relevante. Não vale pois a pena esperar seja o que for, neste particular, das Câmaras Municipais (e muito menos das Juntas de Freguesia…)! O mais que podem fazer é muito semelhante a, por exemplo num montado doente, plantarem-se eucaliptos isolados que, com o seu crescimento de “sucesso”, mais não contribuirão para ainda mais depressa matarem todos os sobreiros e azinheiras sãos à sua volta (e, no final, se matarem todos uns aos outros, por exaustão do solo!).

Quero com isto afirmar que, por mais voluntariosas e imaginativas que sejam certas medidas já encetadas em alguns Concelhos, que basicamente se traduzem em vender património público (terrenos municipais) a preços simbólicos, ou em subsidiar desesperadamente casamentos e nascimentos, tudo isso não passa, em boa verdade, de esbanjamento casuístico dos dinheiros públicos, com efeitos talvez pontualmente visíveis, mas globalmente irrisórios. Dentro de alguns anos estará tudo na mesma, ou pior ainda, assim como quem lança sementes de qualidade em chão estéril…

E a habitual lenga-lenga da coesão territorial e dos famosos “custos da interioridade”, em tempos de crise, já não convence ninguém. A ideia de que nas grandes Cidades se vive bem e que no campo se leva uma vida de sofrimento é “chão” que há muito “já deu uvas”! Qualquer dia nem haverá nada para salvar, se assim continuarmos, e está mais do que provado que tirar dinheiro do orçamento, gerado por quem sua e pena dia-a-dia nas cidades portuguesas, para os autarcas do Interior “brincarem” aos caciques e estoirarem em obras espaventosas (com muito boas intenções, mas que apenas os levam direitinhos ao Inferno!) não mais é politicamente sustentável!

A “vida do campo”, ao contrário do estafado estereótipo literário e comunicacional, é hoje em grande medida uma vida de ócios, quando não mesmo de vícios, sustentados pelos mesmos de sempre: os trabalhadores por contra de outrem, que labutam nas Cidades e que nada podem contra o fisco!

E a solidariedade com o “Interior” que ainda vai havendo é todos os dias abalada e posta em causa por estes e outros factos que se vão conhecendo…


4 – HIPÓTESES DE SOLUÇÃO PARA O PROBLEMA

Mas então, haverá verdadeiras soluções para o despovoamento do Interior? Ninguém o pode assegurar honestamente, mas de uma coisa podemos estar seguros: a inversão das actuais tendências só poderá ser conseguida no quadro de um NOVO PARADIGMA DE POVOAMENTO, que terá de ser baseado nas realidades actuais e nas tendências expectáveis, nunca no retorno ao passado!

Isso implicará, quanto a mim, a definição de uma rede de centros URBANOS (pois que uma das tendências actuais mais fortes em todo o território nacional é para a continuação da urbanização), que garantam a viabilidade de modos de vida e de economias NÃO DEPENDENTES DA ACTIVIDADE AGRÍCOLA!

Essa REDE DE CENTROS URBANOS, devidamente hierarquizada, deverá constituir a âncora para o repovoamento do Interior, em moldes semelhantes ao das Províncias espanholas confinantes com Portugal (e que, aliás, ainda são mais interiores…), garantindo a preservação de algumas Vilas e Aldeias, mas necessariamente SACRIFICANDO MUITAS DELAS, não digo fisicamente, mas pelo menos em termos das suas efectivas condições de vida.

Isto é, se alguém decidir ir viver para uma Aldeia, Lugar, ou mesmo Vila considerada “não sustentável”, em termos do novo paradigma de povoamento nacional, deverá ser informado de que o nível de prestação de serviços POR PARTE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA – nacional, regional e local – será inferior a um certo patamar mínimo exigível nas aglomerações integrantes da tal rede urbana “viável”!

Pode parecer cruel, apresentado assim, mas se analisarmos bem é muito mais honesto do que manter grande parte da população dispersa pelo nosso Interior, sobretudo idosa, NA ILUSÃO DE QUE DISPÕE DESSE NÍVEL MÍNIMO DE SERVIÇOS e, no momento em que realmente deles necessita, descobrir que pura e simplesmente eles não estão, na prática, garantidos! Ou que, para o estarem, há milhares ou milhões de outras pessoas, nomeadamente nas grandes Cidades, para quem esses serviços são DIARIAMENTE INSUFICIENTES OU DE MUITO MÁ QUALIDADE!

Uma tal rede de centros urbanos “sustentáveis” – na qual muitas Aldeias tradicionais poderiam manter-se vivas, desde que potenciando um valor patrimonial e paisagístico compatível com uma adequada sustentação económica à base da actividade turística –, poderia ser uma solução para combater eficazmente o despovoamento, sem com isso insistir na preservação de todas e cada uma das Aldeias e Vilas actuais, pelo menos da forma como elas são actualmente habitadas!

Atente-se que, mesmo “excluindo” deste modelo, por exemplo, todas as Aldeias e mesmo uma ou duas Vilas do Distrito de Portalegre (apenas para dar um exemplo que conheço bem e cuja implementação me afectaria pessoalmente…), a população do mesmo poderia perfeitamente voltar a crescer, à base das suas Cidades e Vilas mais importantes, que conseguissem ser “viáveis” neste novo modelo de povoamento! Desde que dotadas das condições mínimas de viabilidade em termos da prestação de serviços pelo Estado (na Educação, Saúde, Segurança Pública, Justiça, etc.) e, obviamente, se houvesse políticas de apoio à implantação de actividades de base económica sustentáveis! O que, infelizmente, não depende só da vontade dos decisores políticos, mas pode ser influenciada por estes.

Quem quisesse viver fora desta rede urbana, obviamente que o poderia fazer, desde que estivesse disposto a contentar-se com os níveis (inferiores aos mínimos) de serviços que o Estado nelas prestaria. Mas o que é isso para quem possa dar-se ao luxo de suportar por si os encargos adicionais de uma tal situação? E para mais com as modernas facilidades de transporte e de comunicação ao dispor dos economicamente mais fortes…

Assim se evitaria a actual dispersão irracional de meios e recursos, com todas as pequenas aglomerações urbanas a prever “Zonas Industriais” e “de Expansão Habitacional” nos seus planos de ordenamento, que acabam por ficar eternamente expectantes (ou muito sub-aproveitadas) e não permitem uma efectiva concentração de esforços naquelas que, talvez, com alguma intervenção dos poderes públicos, teriam efectivamente oportunidades de subsistência nas novas condições de desenvolvimento!

Acresce ainda que, com a descentralização administrativa subsequente à Regionalização, muitas das cidades do Interior veriam a sua importância substancialmente acrescida, por motivos administrativos, dando mais consistência a esta rede urbana que, a pouco e pouco, transformaria finalmente o velho Mapa de Portugal, ancestral, agrícola e pastoril, no mapa do Portugal do futuro, urbano, industrializado, apto e competente, mais realista e sustentável!

Daí que seja urgente levar por diante as três grandes reformas essenciais do presente, neste domínio:

1ª – Repensar o financiamento dos “custos de interioridade”, numa base de resultados socio-económicos concretos e não de subsidio-dependência;

2ª – Definição de políticas sustentáveis de desenvolvimento regional, com base num novo modelo de povoamento;

3ª – Regionalização do Continente e consequente reorganização do aparelho do Estado e, também, do actual “mapa” autárquico (Municípios e Freguesias)!

Para os saudosistas, há sempre uma boa solução: regressar ao modelo económico tradicional agrícola, das velhas Aldeias cheias de carroças e de mulas, de crianças com sacola e lancheira a caminho da Escola e de “ranchos” nos campos, a mondar, a lavrar e a ceifar – tudo à sua disposição imediata, a preços convenientes e a quatro horas de voo comercial, numa bela região hoje integrada na União Europeia, chamada Transilvânia, onde tudo isto existe, mas tudo isto é triste (mesmo sem o Fado)!…

Ant.º das Neves Castanho.

quinta-feira, maio 03, 2007

CONTRA AS MISTURAS INDIGESTAS!


O 25 de Abril de 1974 pôs termo, através de um Golpe de Estado militar, à ditadura do auto-proclamado “Estado Novo” (há quem prefira chamar-lhe fascismo), ou 2ª República, inaugurando de facto uma era política totalmente nova em Portugal. O maior significado histórico do 25 de Abril foi ter implantado um Estado de Direito Democrático no nosso País, erradicando assim a forma autocrática como o Poder fora, até então, quase sempre exercido em Portugal!

Causa por isso uma profunda irritação continuar a ver e a ouvir, da parte de certos sectores políticos, uma insistente associação, para mim abusiva e nada rigorosa, entre o 25 de Abril e outras datas do mesmo período histórico, em particular o 25 de Novembro, que de forma alguma se lhe podem comparar em alcance político e social e em amplitude de consequências, directas e indirectas!

Sobre esta questão, creio ser mais que do legítimo afirmar que, historicamente, a dimensão e relevância do 25 de Abril o coloca acima de toda e qualquer outra data desse período!

Como data histórica mais importante de todo o Século XX português – verdadeiro momento fundador da nossa Modernidade enquanto Povo –, o 25 de Abril de 1974 só é comparável, de facto, ao 5 de Outubro de 1910, embora este último com muito menor profundidade e densidade, e também, embora muito tenuemente, ao 28 de Maio de 1926, que no entanto lhes fica muito aquém, em termos de alcance histórico, a ambas.

Perante o significado libertador e eminentemente fundador do 25 de Abril, o chamado "25 de Novembro", data tão do agrado da actual Direita parlamentar como, por igual, dos eternos saudosistas de Salazar (convém não o esquecer), não passa de um episódio conjuntural, marcando o final de um processo de correcção da excessiva carga ideológica e programática inculcada no 25 de Abril, a posteriori, pelo 28 de Setembro e, sobretudo, pelo 11 de Março. E, mesmo assim, o "25 de Novembro" não vale por si, como data histórica, porque se encontra associado a duas outras datas igualmente relevantes, apesar de sempre “esquecidas”, mas sem as quais não teria o mesmo significado.

Trata-se, como é óbvio, do momento em que a Assembleia do M. F. A. provoca a demissão do V Governo Provisório, do Gen. Vasco Gonçalves (originando assim a formação do VI Governo Provisório, chefiado pelo Almirante Pinheiro de Azevedo) e, sobretudo, o 7 de Dezembro de 1980, onde finalmente se encerra o denominado “PREC”, com a eleição do Gen. Ramalho Eanes para a Presidência da República, e sem a qual o vitorioso "25 de Novembro" corria alarmantemente o risco de ficar manchado por uma carga de subversão e embaciamento anti-democráticos que, quanto a mim, se colam indelevelmente e mancham incontornavelmente a memória da passagem fugaz de Sá Carneiro pelo cargo de Primeiro-Ministro (e que só a sua morte trágica e, ainda, mal esclarecida tem impedido de, imparcial e objectivamente, evidenciar em todo seu significado!).

O 25 de Abril deu início a um processo político, diplomático e socio-económico muito complexo, que sofreu alguns “acidentes de percurso”, como o 25 de Novembro, mas que nem todos juntos têm uma importância sequer comparável à do dia libertador.

O primeiro sobressalto foi o 28 de Setembro (de 74), onde definitivamente se extingue a influência spinolista ao nível da hierarquia do Estado e, com ela, uma certa visão do 25 de Abril que pretendia reduzi-lo a uma mera cosmética politica – porventura comparável à do 5 de Outubro –, sem verdadeira dimensão económica, social e, acima de tudo cultural – ou seja, ao nível das mentalidades.

Essa visão estrita, formalista e super-estrutural do 25 de Abril foi abandonada e superada, a 28 de Setembro, pela afirmação do 25 de Abril como movimento revolucionário, com objectivos políticos, mas igualmente socio-económicos.

Inconformadas com esta situação, as oligarquias dominante e ascendente, que nessa fase ainda sonhavam com uma mudança de regime apenas superficial e até, talvez, com a manutenção, ainda que em moldes mais suavizados, do velho império colonial português, instigaram o golpe militar, ou tentativa disso, de 11 de Março (de 75), com o qual Spínola tentou mostrar ter ainda algum poder militar não totalmente desprezável, o que fez, porém, ameaçando de uma forma intolerável a nova ordem pública estabelecida, tendencialmente democrática e socialista.

A reacção a este sobressalto foi uma maior radicalização das forças progressistas, mais directamente afectadas pelo salazarismo e, por isso, compreensivelmente mais empenhadas em não deixar retroceder o processo iniciado com o 25 de Abril, o que, por seu turno, provocou o receio de uma excessiva instrumentalização do processo de democratização por parte dessas mesmas forças, muito conotadas com o P. C. P., gerando-se uma crescente tensão entre os sectores mais genuinamente democráticos, legítimos herdeiros do verdadeiro espírito de Abril, e os defensores de um processo mais marcadamente socialista, que recorde-se não constava do cerne programático do Movimento dos Capitães.

Foi o chamado “Verão quente” de 75, que apesar da incerteza e crescente instabilidade que o caracterizam, provocou o necessário amadurecimento dos ideais de Abril e a formação de uma verdadeira consciência democrática nos sectores mais moderados da Esquerda à Direita, que conduziu à supremacia dessa visão moderada nos meios militares e provocou, ainda em Setembro, a queda do Governo gonçalvista, que estava já bastante radicalizado, mas politica e socialmente confinado às “vanguardas” operárias (da Cintura Industrial de Lisboa) e camponesas (do Alentejo).

É a nomeação do VI Governo Constitucional (dirigido pelo Alm. Pinheiro de Azevedo), pelo então Presidente da República (Gen. Costa Gomes), o momento de viragem decisivo para o prosseguimento do ideário democrático de Abril, sem desvios nem perversões anti-democráticas, e não o subsequente 25 de Novembro, onde esta viragem política apenas se traduziu, em definitivo, também no plano militar.

Mas não nos iludamos: aquilo que certos sectores conservadores, tanto quanto os mais saudosistas do “24 de Abril”, vêem e celebram no chamado 25 de Novembro não é, contudo, esse seu significado histórico-militar, relativamente menor em todo o processo, mas sim as hipóteses que esse acontecimento abriu para um retrocesso político – se não já à fase spinolista da Revolução (pois as ex-colónias já se haviam tornado independentes por esta altura) –, pelo menos ao pré-11 de Março, e isto apenas como primeiro passo para um restaurar pleno do 24 de Abril “material”, ainda que sob as vestes de um 25 de Abril “formal”!

Este desígnio foi-se fortalecendo em todo o período que se sucedeu ao 25 de Novembro, com a progressiva ocidentalização da nossa política, interna e externa, e a “descomunização” do aparelho do Estado, aos níveis civil e, sobretudo, militar, e sofreu um substancial impulso com o regresso ao poder, em Dezembro de 79, de um governo de Centro-Direita, chefiado por um “notável” do anterior Regime, ainda que conotado com os defensores de uma maior abertura política (era Deputado na Assembleia Nacional, no tempo de Marcelo Caetano, embora pertencente à denominada “ala liberal”): Francisco de Sá Carneiro!

Embora nesta altura o regime democrático já se houvesse consolidado ao ponto de ser considerado perfeitamente normal o regresso ao poder dos conservadores, por via eleitoral, sem que tal pusesse automaticamente em perigo a Democracia e o Estado de Direito, estes receios ganharam todavia consistência com a perspectiva de, a par da reforçada maioria absoluta por parte dos Partidos de Direita, em resultado das eleições de 5 de Outubro de 1980, ser eleito com o apoio político dessa maioria parlamentar um Presidente da República que não só não apresentava no seu currículo político (aliás nulo!) qualquer leve inclinação para o ideal democrático, como se tratava de um militar de alta patente, que havia servido no tempo da Ditadura e, para mais, prestado serviço em áreas muito sensíveis, nomeadamente ligadas às prisões políticas!

Tudo isto conjugado criou uma sensação de incomodidade em quantos se haviam batido pelo 25 de Novembro movidos por ideais democráticos, vendo agora a iminência de, em consequência da vitória das forças moderadas, se poder ter ingenuamente aberto caminho para a recuperação das forças politico-militares conotadas com o antigo regime.

Felizmente para a Democracia portuguesa, o temido cenário de retrocesso político foi definitivamente afastado com a inequívoca derrota do candidato das forças conservadoras (o Gen. Soares Carneiro) nas eleições presidenciais de 7 de Dezembro de 80, permitindo a consolidação segura do rumo democrático aberto pelo 25 de Abril, briosamente defendido a 28 de Setembro, condicionado a 11 de Março, aparentemente restaurado a 25 de Novembro, mas finalmente, de uma forma inequívoca, apenas com esta indispensável rectificação a 7 de Dezembro, data a partir da qual se pode, enfim, considerar definitivamente encerrado o “PREC”, bem como derrotado historicamente o regime anterior ao 25 de Abril.

A partir daí e até aos nossos dias, não voltaram de facto a verificar-se quaisquer sobressaltos neste percurso democrático, sempre incompleto, mas cada vez mais enraizado na Sociedade portuguesa, tendo-se assistido imperturbavelmente: à extinção das últimas manifestações institucionais do período revolucionário (o Concelho da Revolução, em 82), a várias revisões constitucionais, a sucessivos Governos e Presidentes da República, posicionados da Esquerda à Direita, a crises económicas e financeiras graves, à adesão às Comunidades Europeias, à substituição da moeda nacional, tudo sempre numa absoluta normalidade institucional e tranquilidade social, que só pode encher-nos de orgulho.

Por isso repito: há que celebrar e testemunhar Abril, enquanto é tempo, para que não se esqueça nunca o seu real e profundo significado, hoje já histórico!

E, novamente, pergunto: é possível imaginar Portugal, hoje, sem o 25 de Abril? A resposta só pode, evidentemente, honestamente, universalmente, ser NÃO!


António das Neves Castanho.

Comemorar o 25 DE ABRIL, SEMPRE!



UMA PERSPECTIVA HISTÓRICA NO SEU 33º ANIVERSÁRIO

O 25 de Abril de 1974 pôs termo, através de um Golpe de Estado militar, à ditadura do auto-proclamado “Estado Novo” (há quem prefira chamar-lhe fascismo), ou 2ª República, inaugurando de facto uma era política totalmente nova em Portugal!

Porém, o maior significado histórico do 25 de Abril deve-se sobretudo a ter implantado a Democracia no nosso País, erradicando assim a forma autocrática como o Poder fora, até então, quase sempre exercido em Portugal!

Este facto, quanto a mim, não tem sido evidenciado com o ênfase pedagógico indispensável a uma correcta assimilação do seu profundo significado pelas gerações mais jovens, que já não têm memória desse dia libertador e, muito menos, dos contornos do regime que vigorou em Portugal, ininterruptamente, nos quarenta e oito anos anteriores! E isto constitui a mais grave lacuna do reconhecido agora, enfim, insuficiente tratamento dado ao 25 de Abril nas aulas de História.

Em toda a História de Portugal, mesmo após o advento do designado “Liberalismo”, no segundo quartel do Séc. XIX, que o poder do Estado se exercia sempre de uma forma autocrática, onde imperavam as oligarquias económicas (a partir do Liberalismo com força sempre crescente) e nobiliárquicas (a partir daí com influência decrescente) e dominada, igualmente, pelo Alto Clero católico.

Isto num contexto geral de pobreza e miséria, que apenas a exploração colonial ia disfarçando, e com uma Sociedade atávica, mergulhada ainda no mais completo obscurantismo feudalista, à excepção, pouco relevante, de certas “elites” sociais e académicas, concentradas (ou, melhor dizendo, praticamente “acantonadas”) em Lisboa, Porto e Coimbra.

Enquanto por toda a Europa, já para não falar no pioneirismo da América do Norte, o Liberalismo construía gradualmente um caminho de prosperidade económica e aperfeiçoamento social, com as progressivas conquistas da Democracia e do Estado de Direito, acrescido de cada vez maiores avanços no campo Social, devidos sobretudo à influência conjugada das ideias marxistas e social-democratas, com perda de influência da Religião nos assuntos do Estado, em Portugal esse caminho apenas a muito custo ia sendo trilhado, e sempre de uma forma incompleta, atrasada e extremamente condicionada, muitas vezes até pelo uso da força.

Até à implantação da República, Portugal e o Povo português estavam num estádio de desenvolvimento económico e, sobretudo, social comparável ao da Europa pré-revolucionária, feudal e absolutista, face à reduzidíssima expressão, ao nível político, da implantação do Liberalismo! Este período obscuro da nossa História, que se sucede a uma terrível Guerra Civil e que nos transforma numa quase colónia inglesa, foi como que “apagado” pela historiografia oficial do Estado Novo, que dele só deixou na nossa memória os aspectos mais inócuos ligados ao desenvolvimento económico – o denominado “fontismo”, que praticamente se resume à introdução e expansão do Caminho-de-Ferro –, ou ao mais inflamado nacionalismo – as explorações na África Austral (Serpa Pinto, Brito Capelo, Roberto Ivens) e a tristíssima história do “Mapa côr-de-rosa”, que acabou aliás por precipitar o fim da Monarquia –, como se nada mais tivesse tido importância em Portugal nesses quase cem anos! Que todavia são cruciais para a compreensão do nosso colossal atraso na actualidade!!

Por outro lado, antes do 25 de Abril, a única experiência séria que Portugal tivera de Democracia, pelo menos actualizada com os cânones da sua época, fora apenas durante os conturbados dezasseis anos da Primeira República. Só que aí, a meu ver, o Estado de Direito nunca chegou verdadeiramente a consolidar-se, apesar de formalmente exercido. Pelo menos na totalidade do tecido social e, igualmente, do território nacional. Isto é, o 5 de Outubro nunca chegou, verdadeiramente, a consolidar o seu triunfo (e, por isso mesmo, acabou por perecer a 28 de Maio…)!

Tudo isto bastante por culpa de uma fortíssima reacção, por parte das referidas oligarquias, à ruptura que uma integral implantação da República em Portugal implicaria com o tradicional e secularmente consolidado exercício autocrático do Poder, que logrou conduzir a República – e, com ela, a recém-nascida e, por isso, muito frágil Democracia portuguesa – a sucessivos patamares de crescente instabilidade até uma insustentável ingovernabilidade. Com a sempre prestimosa ajuda da hierarquia católica – para o que muito “oportunamente” contribuíu o emergente mito de Fátima!

Tudo isto num contexto internacional de crise e recessão económica, gravíssimas, que levaram inclusivé ao desenvolvimento, no coração da Europa civilizada, de regimes políticos inspirados nas práticas medievais, como o nazismo e o fascismo, tornou possível e até fácil o tremendo retrocesso político e social corporizado pelo 28 de Maio!

Ora a fundamental diferença do 25 de Abril face ao 5 de Outubro é que o primeiro não só triunfou por completo, banindo definitivamente de Portugal a forma tradicional e autocrática do exercício do Poder, como alastrou a sua influência, em simultâneo, ao todo nacional, quer social, quer territorialmente!

O profundo e seminal significado histórico desta drástica mudança, em minha opinião, não está a ser nem nunca foi devidamente explicado, mas com o avolumar da perspectiva histórica emergirá, fatalmente, na consciência nacional!

É que o 25 de Abril configurou, no fundo, não apenas uma mudança política formal, ao nível super-estrutural, mas sobretudo uma autêntica Revolução social e mental, com implicações muito profundas e, eventualmente, irreversíveis em termos da evolução colectiva do Povo português! Por isso nunca é demais realçar que a implantação duradoura de um Estado de Direito Democrático estável em Portugal foi o maior sucesso histórico da Revolução dos Cravos.

Mas não o único, uma vez que, apesar da magnitude das mudanças operadas, foi possível verificar-se, nos meses e anos que se sucederam ao 25 de Abril, uma transição relativamente serena e pacífica para um regime democrático, que nunca tinha feito escola em Portugal e que, por isso mesmo, teve que ser “inventado” praticamente a partir do zero, não só em termos formais (jurídico-legais), como sobretudo em termos funcionais, já que a vivência prática da democracia era totalmente estranha ao tecido social do País!

Não obstante, apenas dois anos e meio após o 25 de Abril, o País já dispunha de:

i) uma Constituição Democrática;
ii) um Governo legítimo e incontestado, internacionalmente reconhecido;
iii) uma Assembleia Legislativa e um Presidente da República eleitos por sufrágio universal e directo;
iv) duas Regiões Autónomas,
v) trezentos e três Municípios e mais de quatro mil Freguesias administrados por autarcas democraticamente eleitos e, ainda,
vi) os novos sistemas judicial e militar perfeitamente institucionalizados,

o que não deixa de ser absolutamente admirável e ímpar, talvez em todo o Mundo, para mais num País que, em toda a sua História, raramente havia sido governado por um regime constitucional e democrático estável!!!

Se somarmos a tudo isto a proeza de todas estas profundas mudanças se terem concretizado sem sobressaltos sociais de maior, à parte uma compreensível instabilidade socio-económica e politico-militar, relativamente pontual, nos primeiros dois anos – e que nunca chegou ao risco real de uma guerra civil, que apenas num determinado momento (o 25 de Novembro de 75) quase chegou a poder tornar-se sério –, e a par com a descolonização de cinco territórios africanos, que originaram outros tantos Países independentes, e o concomitante retorno de várias centenas de milhar de repatriados, há que convir estarmos perante um período histórico absolutamente incomparável em todo o Século XX português!

Agora se o 25 de Abril, na totalidade dos seus objectivos iniciais, se cumpriu ou não, isso é um pouco mais difícil de aquilatar. Perante todas estas conquistas, ter-se-á cumprido no essencial. Mas sem dúvida que uma promessa importante do 25 de Abril era a Justiça Social, o chamado “25 de Abril económico”, e essa foi mais incompleta e dificilmente conseguida.

Mesmo assim, as profundas transformações que caracterizam o pós-25 de Abril, se não mudaram radicalmente o tecido social e económico – dado que o sistema capitalista, ou de economia de mercado, se manteve relativamente incólume, apesar de algumas derivas iniciais –, pode considerar-se representarem um corte profundo com a situação anterior, atendendo ao estado de desenvolvimento sócio-económico em que o País ainda se encontrava.
Tudo contabilizado, direi que se o 25 de Abril se não cumpriu totalmente, é talvez porque tinha uma ambição idealista tal, aos níveis económico e social, que transcendia em muito as capacidades de uma geração e que, porventura, irá perdurar, como objectivo e desígnio, para as gerações presente e futuras, a par com os naturais desafios do aprofundamento da Democracia, é bom não esquecer. Mas este tema ficará para uma outra oportunidade…

Hoje, há que festejar e testemunhar Abril, enquanto ainda é tempo, para que nunca se esqueça ou diminua o seu real e profundo significado.

E, já agora, aplaudir as intenções do Governo de procurar melhorar, nas escolas portuguesas, o ensino do 25 de Abril e do profícuo e mágico período que lhe sucedeu, subtraindo-o assim à – nos dias de hoje tão em moda, de uma forma predominante e mediática – visão mistificadora e miseravelmente redutora desta data memorável por parte de quem, tendo na altura tido pouco ou nenhum entusiasmo não apenas pela data em si, mas pelo próprio derrube da Ditadura salazarista-marcelista, hoje se encontra de novo confortavelmente instalado ao leme dos poderes económicos e sociais em Portugal!

Para terminar, pergunto apenas: seria possível imaginar Portugal, hoje, sem o 25 de Abril?

António das Neves Castanho.

quarta-feira, maio 02, 2007

AMBIENTE E DIREITOS DO CONSUMIDOR...


… NA «RÁDIO EUROPA-LISBOA»


Subordinada à temática em título, Helena Matos tem uma crónica regular nesta ainda pouco conhecida estação de rádio (que, tanto quanto sei, apenas é possível ouvir em Lisboa, sendo aliás a herdeira da extinta «Rádio Paris–Lisboa»). Numa das suas crónicas recentes entendeu formular duras críticas ao Movimento Cívico “Regiões, Sim!”, o que à partida, só por si, não mereceria este meu artigo.
Acontece, porém, que nessa crónica utilizou “argumentos” de tal modo inaceitáveis, não só contra a criação deste Movimento, como sobretudo contra a Regionalização, que não resisto a partilhá-lhos com os leitores deste blogue que não tenham podido ouvir. A certa altura da sua crónica, Helena Matos, que suponho seja jornalista de profissão, menosprezou o facto de a Regionalização ser um imperativo constitucional com esta expressão verdadeiramente antológica: “ (…) há muita coisa que também está na Constituição e que nunca se cumpriu, e ainda bem!”. É a sua opinião, livre como todas, mas que me abstenho de qualificar – cada um fará o seu próprio julgamento.
Mas o pior foi quando resvalou, descontraidamente, para uma quase total ignorância sobre o assunto: com Helena Matos, aprendemos que a Regionalização será, afinal, um mero "prolongamento de uma infinidade de organismos e instituições que já temos”, como as CCDR’s, as Direcções Regionais e Distritais dos vários Ministérios, etc., e que apenas terá como consequência “um natural aumento da burocracia”, que é coisa que, “evidentemente, ninguém deseja…”.
Como se pode ver, para quem pouco ou nada soubesse sobre este assunto, foram inestimáveis os “bons serviços” que esta rádio (que até tem bastante qualidade musical, diga-se de passagem), em tão poucos minutos, terá prestado ao esclarecimento da opinião pública portuguesa!...
Sem pretensões a tentar colmatar as evidentes e alargadas insuficiências de conhecimentos da Autora sobre o tema que, levianamente, elegeu para esta sua crónica, apenas lhe endereço daqui um prudente conselho, extensível aliás aos responsáveis desta rádio tão “nominalmente” europeia: experimentem tentar publicar uma crónica assim, na rádio ou noutro meio de informação, num qualquer País europeu dos “27”, porque não até a própria França (grande parte dos programas desta rádio são emitidos em língua francesa), que seguramente serão tomados por estranhas e exóticas criaturas, portadoras de uma linguagem indecifrável e provindas de um tempo julgado já extinto, como o dos dinossauros (mas que, infelizmente e sem que muitos europeus o saibam, continua bem vivo em Portugal…)!
E, já agora, interpretem esta minha crítica apenas como o contributo de um ouvinte assíduo para a melhoria do ambiente (intelectual) em Portugal e para a defesa dos direitos dos consumidores
de Rádio!
António das Neves Castanho.