sexta-feira, junho 24, 2005

APANHADOS, só do último mês

ü O Ministro da Saúde, face ao indicador de que a taxa de contaminação no Hospital de São João (no Porto) é o dobro da média nacional, logo concluí-o que o problema está nos técnicos e profissionais de saúde deste hospital: "há muitas mãos que não são lavadas, muitas luvas que protegem o profissional, mas que transportam a infecção de um doente para outro" (DN).
O administrador do hospital tentou impingir-nos, numa atitude que todos percebem ser corporativista, argumentos como o de "condições precárias de um edifício concebido há quase 100 anos" e "instalações sanitárias a servir 30 doentes, enfermarias de oito ou mais camas, pacientes a dormir em corredores", que todos percebemos que “não têm ponta por onde se pegue”, claro!
Desta diferença de opiniões ficamos pelo menos esclarecidos quanto ao facto desta tradição de os Governos Portugueses serem dos maiores da Europa: também em quantos países é que os Ministros têm esta escala de preocupações, quantos é que se preocupam com a lavagem das mãos dos seus funcionários???

ü Sobre as cheias de Verão na China, são sucessivas as notícias sobre a sua capacidade destruidora: “as autoridades revelaram que as fortes chuvas, as cheias e o deslizamento de terras destruíram mais de 130 mil casas e 1.8 milhões de hectares de terra agrícola.” (JN)
“As primeiras inundações começaram há três dias, depois de 12 horas seguidas de precipitação intensa. A época de chuvas arrancou oficialmente na quinta-feira e a previsão aponta para condições piores do que no ano passado. Em 2004, morreram mais de mil e trezentas pessoas nas chuvas de Verão.” (SIC)

ü Em entrevista à SIC Notícias, Maria de Lurdes Rodrigues, confrontada com o facto de um tribunal de Lisboa e um dos Açores terem tido decisões diferentes sobre a questão dos serviços mínimos sobre a greve dos professores, disse que os dois tribunais pertencem a sistemas diferentes.
«É um pronunciamento sobre um despacho do Governo Regional de um tribunal dos Açores, que não é de Lisboa nem respeita à República Portuguesa, portanto não respeita ao nosso sistema» (TSF online), explicou.
É evidente, e todos percebemos que o que se passa nos Açores não tem nada a haver com a República Portuguesa. Nós já andávamos desconfiados por causa da Madeira, agora se a Ministra diz que o sistema dos Açores não tem nada a haver com o de Portugal, pronto! Assunto encerrado.

ü Cheias também no Brasil: “Entretanto, 30 pessoas morreram, mais de 30 mil estão desalojadas e 15 mil desabrigadas, devido às fortes chuvas que caíram nos últimos dias, no Estado de Pernambuco, no Brasil.” (JN)

ü Nas nossas coordenadas geográficas, o mês de Maio não é propriamente um período de baixas temperaturas. Aliás antecede o fim das aulas e o início das “férias grandes / de Verão”. O calendário de muitas outras actividades também está relacionado com este facto. Este é o momento em que acabam os campeonatos de futebol (super liga e taça).
No fim deste Maio cruzei-me com inúmeras pessoas em Lisboa usando cachecol e gorro de lã. Também em Setúbal as televisões mostravam a utilização destas peças de vestuário de Inverno. E a preocupação é tal que muitos carros traziam cachecóis na parte de trás, não fossem os proprietários necessitar dele a qualquer momento devido ao a qualquer alteração do estado do tempo…

ü Espanha enfrenta o ano mais seco das últimas seis décadas (SIC Online)

E com tudo isto, há pessoas que resistem à ideia de estarmos num período de profundas alterações climáticas. Não é evidente que elas estão aí e já afectam muito gravemente muitos? Então esta malta não anda um bocado apanhada? Não há sinais graves directamente do conselho de Ministros? Não estamos todos “apanhados do clima”?

António Sérgio Manso Pinheiro
Junho de 2005

O PEC2005-2009 NÃO É UM PROGRAMA DE CRESCIMENTO MAS SIM DE ESTAGNAÇÃO ECONOMICA E DE ATAQUE AOS DIREITOS DOS TRABALHADORES PORTUGUESES

O ” Programa de Estabilidade e de Crescimento: 2005-2009 (PEC2005-2009)” apresentado pelo governo, por exigência da União Europeia, substitui, na prática, o programa Eleitoral do PS e o Programa de governo, até porque vai ser controlado por aquela instituição europeia.

De acordo com o “PEC2005-2009”, o objectivo de crescimento económico subordina-se ao objectivo de redução do défice orçamental, passando a ser a diminuição do défice o objectivo central da acção do governo, mesmo sacrificando o desenvolvimento económico e social do País. E a justificação é que “o País depois do inferno terá o paraíso”, mas isso não é verdade.

Para conseguir reduzir o défice orçamental em 4 pontos percentuais (de 6,8% para apenas 2,8%, ou seja, 5.600 milhões de euros), em 3 anos apenas (2005-2008) o governo pretende: (1) dinamizar a chamada “bolsa de suprenumerários” na Administração Pública para onde pretende atirar todos os trabalhadores considerados pelas respectivas chefias “excedentários ou inadequados ao serviço”, pondo assim tal labéu a muitos trabalhadores, criando desta forma as condições para o despedimento; (2) alterar o sistema de aposentação dos trabalhadores da Administração Pública que entraram antes de 1 de Setembro de 1993, cujos direitos adquiridos todos os governos anteriores respeitaram, mas que o actual governo pretende não fazê-lo aumentando a idade de reforma em 5 anos e reduzindo o valor da pensão por cada ano de serviço realizado depois de 31.12.2006 em 20% (a forma de cálculo da aposentação a partir de 31.12.2005 consta das págs. 3 e 4 deste estudo); (3) aumentar a idade de reforma dos trabalhadores por conta de outrem do regime geral da Segurança Social; (4) reduzir as comparticipações nos genéricos e em outros medicamentos entre 5% e 10%, com a justificação de que as farmácias e os laboratórios vão reduzir os preços dos medicamentos em 3%; (5) aumentar o IVA de 19% para 21% e os impostos sobre os combustíveis todos os anos o que determinará o aumento generalizado dos preços; (6) impor aos trabalhadores da Administração Pública o congelamento das progressões nas suas carreiras profissionais assim como aumentos de remunerações inferiores às subidas de preços, o que determinará diminuição do poder de compra dos vencimentos; (7) dar aos patrões privados orientações para que respeitem uma politica de “moderação salarial” o que significa que façam o mesmo que o governo pretende impor aos trabalhadores da Administração Pública;(8) reduzir, em termos reais, pelo menos até 2007 o investimento público o que determinará mais retrocesso económico e mais desemprego; (9) continuar a politica de privatizações das empresas públicas destruindo assim um importante instrumento de politica económica e uma fonte importante de receitas para o Orçamento do Estado.

É evidente, contrariamente àquilo que o governo afirma, que esta politica de submissão às exigências da União Europeia e a interesses económicos, criará inevitavelmente grande instabilidade no País com elevados custos sociais e económicos, e não é uma politica de crescimento económico mas sim de estagnação, que afastará ainda mais o País da média comunitária e acarretará mais desemprego.

O governo apresentou aquilo a que chamou “Programa de Estabilidade e Crescimento:.2005-2009” (PEC2005-2009). A razão utilizada para o apresentar foi de que é necessário para cumprir o défice de 3% exigido pela U.E.. Desta forma associou, aos olhos dos portugueses, estagnação económica, mais desemprego e mais sacrifícios à União Europeia.

É evidente que os programas que tinha apresentado anteriormente – programa eleitoral, programa de governo – foram pura e simplesmente esquecidos e substituídos por este programa que é um programa dominado pela obsessão do défice. Este programa, como se vai provar neste estudo, tem muito pouco de crescimento e é difícil, para não dizer mesmo impossível, pensar que sem crescimento possa haver estabilidade. Para além disso, ele contem um ataque cerrado aos direitos dos trabalhadores da Administração Pública e também aos dos outros trabalhadores, por isso provocará inevitavelmente grande instabilidade social em todo o País.

OBJECTIVOS CONTRADITÓRIOS

No Programa começa-se por afirmar que o objectivo “para o período 2005-2009” é “retomar a convergência com a média Europeia e alcançar em 2009 um crescimento do PIB de 3%” (pág. 5), mas logo a seguir diz-se que isso terá de ser alcançado sob “uma fortíssima redução do défice dos actuais 6,8% para um valor abaixo dos 3% já em 2008 e um esforço de redução da divida pública, dos actuais 67% para 64,6% em 2009” (pág. 5), ou seja, o primeiro objectivo tem-se de submeter ao segundo.

E esta conclusão ainda se torna mais evidente se se tiver presente que, de acordo com o próprio programa, “o objectivo de médio prazo desejável deveria corresponder, no caso português, a um défice subjacente de cerca de 0,5% do PIB”, mas “o défice subjacente projectado para 2009 será ainda de 1,6% do PIB” (pág. 5). A obsessão pelo défice continua e a intenção de o reduzir o défice em apenas 3 anos para um valor inferior mesmo a 3% (2005: -6,2%; 2006:-4,6%; 2007:-3,9%; e 2008:-2,8%; pág. 3), portanto para valores que nunca foram atingidos em Portugal, e ainda por cima num período de grave crise económica do País e de baixo crescimento económico na U.E. de que Portugal está profundamente dependente em termos de comercio externo (cerca de 80% das exportações portuguesas) é apostar na recessão económica e na ruptura e em confrontos sociais. Sobre isso não poderá haver dúvidas.

MEDIDAS MAIS IMPORTANTES CONFIRMAM POLITICA DE OBSESSÃO DO DÉFICE

A análise atenta das medidas mais importantes constantes do PEC2005-2009 apresentado pelo governo confirmam que a preocupação fundamental, para não dizer mesmo exclusiva, é a obsessão do défice orçamental.

Assim, o governo propõe-se implementar medidas na área da saúde, da educação, das finanças locais, da segurança social ( funcionários públicos e também trabalhadores em geral), de aumento de impostos, na área da Administração Pública, no domínio das privatizações, e mesmo no campo dos investimentos, cujos objectivos são sempre , e fundamentalmente, para não dizer mesmo exclusivamente, a redução do défice orçamental. E chega-se mesmo ao ponto de afirmar que se as medidas previstas não forem suficientes para reduzir o défice para os valores previstos, o governo “compromete-se a adoptar medidas adicionais de forma a manter, mesmo em condições menos favoráveis, o objectivo de conseguir um défice público inferior a 3% do PIB em 2008” (pág. 12)., ou melhor, a 1,6% em 2009 (pág.5).

Em resumo, o governo pretende reduzir o défice dos 6,8% do PIB previstos inicialmente para 2005 para 2,8% do PIB em 2008, ou seja, reduzi-lo em 4 pontos percentuais. Como cada ponto percentual corresponde actualmente a 1.400 milhões de euros, quatro pontos percentuais do PIB correspondem a preços actuais a 5.600 milhões de euros (1.120 milhões de contos) de redução nas despesas da Administração Pública, o que é um valor muito grande.

A obsessão pelo défice é clara, e o governo pretende sacrificar ainda mais a Economia Portuguesa, a qualidade dos serviços públicos e o já baixo nível de vida dos trabalhadores e de outras camadas desfavorecidas da população para atingir aqueles valores de défice.

A nível económico, no campo da criação de emprego, de aumentos de salários e das pensões, de combate às graves desigualdades existentes no nosso País, não se encontra prevista qualquer medida no Programa de Estabilidade e Crescimento para o período 2005-2009 com significado que possa inverter o perigoso estado de desaceleração e mesmo de recessão económica e de redução das condições de vida em que o País se encontra mergulhado há vários anos.

MEDIDAS CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Para atingir os objectivos enunciados anteriormente, muitas das medidas constantes do PEC2005-2009 são essencialmente medidas visando a redução pura e simples de despesas e não têm como objectivo aumentar a qualidade, eficiência e eficácia dos serviços públicos prestados à população. Para além disso, a sua natureza e a forma como estão a ser lançadas vão determinar naturalmente graves perturbações nos serviços públicos com reflexos negativos na qualidade dos serviços prestados à população. Neste campo verifica-se mesmo uma grande irresponsabilidade que terá como consequência custos económicos e sociais elevados.

Assim, e com esse objectivo, o governo encomendou a consultores externos, naturalmente bem pagos, mas com reduzida experiência e conhecimentos do que são serviços públicos, auditorias cujo objectivo mais importante é a redução de consumos e de pessoal.

Chega-se ao ponto de fixar no próprio PEC2005-2009, como objectivo, antes mesmo de terminar as referidas auditorias “uma redução, ao longo da legislatura, de 10% dos consumos intermédios do conjunto da Administração Pública (pág. 35 ).



A PREPARAÇÃO DE DESPEDIMENTOS E DE REDUÇÃO DE DIREITOS NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Na área do Pessoal, e com o objectivo de reduzir despesas, o governo pretende dinamizar a chamada “Bolsa de Suprenumerários” para onde pretende atirar todos “os trabalhadores considerados excedentários ou inadequados ao serviço” (pág. 35 do PEC2005-2009), acenando já com as seguintes medidas contra eles: “Ao fim de 3 meses, os funcionários perderão o chamado vencimento de exercício, que corresponde a um sexto do seu vencimento. Enquanto na bolsa, um funcionário não poderá recusar uma proposta de colocação, em condições a estabelecer, sob pena de perder o vinculo à função pública. E como incentivo à saída da Administração Pública para o sector privado” acena-se “ com “o direito automático a usufruir de licenças sem vencimento “ (págs. 35 e 36). Os objectivos são claros: o governo pretende descartar-se daqueles trabalhadores que sejam considerados pelas chefias, muitas delas já nomeadas por ele, como trabalhadores “excedentários ou inadequados aos serviços”. Desta forma o arbítrio pode-se instalar em toda a Administração Pública e será colado a muitos trabalhadores o labéu de “excedentários ou inadequados aos serviços” ( o leitor imagine-se que no seu local de trabalho lhe era colada tal etiqueta, como se sentiria?) .

Na área das carreiras profissionais dos trabalhadores, o governo pretende congelar de uma forma generalizada as progressões nas carreiras até ao fim de 2006 (com esse objectivo até já elaborou um projecto de lei) e “reformar profundamente o sistema de carreiras e remunerações até ao final de 2006, reduzindo substancialmente o número de carreiras, bem como limitando drasticamente os elementos de progressão automática actualmente existentes” (pág. 36).

Neste campo existe já uma experiência, ou melhor, uma tentativa com o mesmo objectivo, que permite tornar transparente aquilo que o governo tem em mente. E essa experiência é a proposta de ACT para os Hospitais SA, agora chamados Hospitais EPE, apresentada aos Sindicatos pelo Ministério da Saúde que tinha e tem os mesmos objectivos e que só não foi para a frente devido à oposição generalizada dos sindicatos.

Os resultados para os trabalhadores dos Hospitais SA dessa “reforma profunda do sistema de carreiras e remunerações” eram nomeadamente os seguintes: (a) Redução do valor hora pago aos profissionais de saúde que variava entre -30% (médicos ) e -10% (restantes trabalhadores); (b) Criação de categorias com outros nomes, onde em cada uma se incluía um grande número de profissões actuais (por ex., a nova categoria “ Especialistas de serviço de suporte” pretendia incluir as actuais categorias “Especialistas de informática”, “Técnicos de informática” e “Pessoal Técnico do Regime geral”, etc,), com redução dos níveis, o que determinava que trabalhadores com diferentes especializações fossem obrigados a realizar, indiferentemente, todas as funções. Esta situação associado a uma redução para apenas 4 níveis e ao aumento do horário semanal de trabalho determinava um redução significativa do valor hora pago a esses profissionais. Foi o 1º caso, em toda a história da contratação colectiva em Portugal, em que uma entidade patronal, neste caso o Ministério da Saúde, apresentou uma proposta de ACT em que defendia uma redução nominal da remuneração hora que os trabalhadores já auferiam.

A juntar a tudo isto está a intenção de impor, como consta do PEC2005-2009 apresentado pelo governo, durante o período compreendido entre 2005-2009 uma “actualização da tabela salarial em 2% ao ano” (pág. 49), quando no mesmo documento se prevê uma taxa de inflação superior em todo o período (2,7% em 2005; 2,9% em 2006; e em todos os restantes anos, uma taxa de inflação de 2,5 ao ano; pág. 54). E como a experiência tem mostrado as previsões do governo relativamente à taxa de inflação são sempre ultrapassadas, o que determina que a redução do poder de compra dos vencimentos ainda seja superior à prevista.

Para além disto o governo tenciona reduzir para 65% do vencimento diário aquilo que o trabalhador terá direito em cada dia que estiver doente. Neste momento ainda não é claro se o trabalhador terá direito àquela parcela de vencimento correspondente aos 3 primeiros dias pois se o esquema for igual ao sector privado não terá direito.

AS ALTERAÇÕES NO REGIME DA CGA E AS CONSEQUÊNCIAS PARA 400.000 TRABALHADORES. Como será calculada a nova pensão de aposentação?

O argumento mais utilizado pelo governo a nível de opinião publica para justificar o não respeito por direitos adquiridos no campo da segurança social dos trabalhadores da AP é que são “privilégios injustificáveis”. No entanto, todos esses “privilégios” foram implementados através diplomas legais aprovados pelo governo. Enquanto tem esta atitude, o mesmo governo já não considera como “privilégio injustificável” que alguém tenha direito a uma pensão de 8.000 euros, com apenas 6 anos de serviço, paga por uma entidade pública, e a receber a partir dos 49 anos de idade acumulando com outros rendimentos.

Devido à sua complexidade e também as consequências graves que terão para os trabalhadores as alterações que o governo pretende introduzir na idade e no cálculo da pensão de aposentação vai-se explicar como mais pormenor a forma como o novo sistema funcionará. Tenha-se presente que vai-se utilizar a pouca informação que consta do PEC2005-2009 (pág. 39), só se podendo ficar a conhecer efectivamente como funcionará após a publicação da respectiva lei. No entanto é já possível dar uma ideia clara daquilo que o governo tem em mente neste campo.

Como se sabe, em 1993, o governo em funções nesse ano decidiu que todos os trabalhadores que entrassem para a Administração Pública depois de 1 de Setembro daquele ano ficariam abrangidos pelo Regime Geral da Segurança, portanto pelo regime que se aplica aos trabalhadores do sistema privado (reforma aos 65 anos, 2% do salário pensionável por cada ano de descontos para a Segurança Social, máximo de reforma 80% do salário pensionável). No entanto, respeitou os direitos adquiridos pelos trabalhadores pois o novo regime não se aplicava aos trabalhadores que entraram para a Administração Publica antes de 1 de Setembro de 1993. Agora a intenção do governo é não respeitar os direitos adquiridos por esses trabalhadores, pois tenciona alterar o sistema de aposentação dos trabalhadores que entraram antes de 1993.

E as alterações anunciadas são nomeadamente as seguintes: (1) Até ao fim de 2005 aplicar-se-á o sistema actual, ou seja, aposentação aos 60 anos de idade, com 36 anos de serviço, uma pensão igual a 90% do vencimento que se estava a receber, e por cada ano a menos de 60 anos uma redução de 4,5% na pensão a que tinha direito se tal não fosse feito (2) A partir de 31 de Dezembro de 2005, por cada ano para além de 2005, o limite dos 60 anos em que um trabalhador se pode aposentar actualmente será aumentado em seis meses (no fim de 2006, a idade de reforma passará para 60,5 anos e assim sucessivamente até atingir os 65 anos), e a pensão referente a este período (depois de 31.12.2005) será calculado da mesma forma que a dos trabalhadores do regime geral, ou seja, multiplicando o número de anos deste período por 2% e pelo chamado vencimento pensionável ou relevante; ( c ) No caso do trabalhador ter anos de serviço antes e depois de 31.12.2005, serão calculados dois valores – uma pensão referente ao período até 31.12.35 utilizando o método de cálculo actual da pensão de aposentação da função pública que chamamos “p1”; a outra pensão relativa ao período posterior a 31.12.2005 utilizando o método de cálculo actual da pensão dos trabalhadores do regime geral da Segurança Social (para isso, considera-se os vencimentos dos 15 anos anteriores à data da sua reforma e actualiza-se esses vencimentos anuais para o ano da reforma com base no Índice de Preços; seguidamente selecciona os dez vencimentos mais elevados e calcula depois o vencimento médio, fazendo uma média aritmética. O valor assim obtido chama-se vencimento pensionável ou relevante, e para obter a pensão referente ao período posterior a 31.12.2005 tem de multiplicar o valor anteriormente obtido pelo número de anos de serviço feitos depois de 31.12.2005 e depois o resultado obtido multiplica-se agora por 2%, ou seja, 0,02); repetindo, é esse valor assim obtido que chamamos “p2”.

A pensão de aposentação que o trabalhador receberá obtém-se calculado a média ponderada, em que os pesos a atribuir a cada uma pensões anteriores são o número de anos de serviço até 31.12.2005 a que chamaremos “n1” e o número de anos de serviço feitos depois de 31.12.2005 a que chamaremos “n2”. Em resumo, a formula matemática utilizada para calcular a pensão de aposentação, que é a de uma média ponderada, é a seguinte: PENSÃO DE APOSENTAÇÃO (dos trabalhadores que entraram para a função pública antes de 1 de Setembro de 1993, e que se aposentem depois de 31.12.2005) = ((p1 x n1)+ (p2 x n2 ) / (n1+n2) [1]

As alterações que o governo pretende impor na segurança social dos trabalhadores da Administração Pública determinarão dois tipos de prejuízos pata os trabalhadores: (1) O primeiro, o aumento da idade de reforma de 60 para 65 anos;(2) o segundo, que não é menos importante, será o de que por cada ano de serviço realizado depois de 31.12.2005 o trabalhador receberá um valor de pensão correspondente apenas a 2% do vencimento pensionável ou relevante, que é o do regime geral, e não 2,5% que é o valor utilizado actualmente para o calculo da pensão de aposentação (os 2,5% obtém-se dividindo os 90% de vencimento a que têm direito pelos 36 anos de serviço que tem de ter para receber uma pensão igual a 90% do vencimento na data da aposentação). Isto significa uma redução de 20% na pensão por cada ano de serviço realizado a partir de 31.12.2005.

O trabalhador comparando o valor que obteve da forma indicada anteriormente com o que obtém utilizando a formula de cálculo actual da pensão de aposentação da função pública ficará com uma ideia da diminuição da sua pensão. No entanto, chama-se a atenção para o facto de que só quando o governo tornar público o projecto de lei é que se poderá ficar com uma ideia clara da perda total e certa para os trabalhadores, pois existem situações que ainda não estão totalmente esclarecidas mas que são importantes, nomeadamente as seguintes: ( a) Como é calculado o vencimento pensionável ou relevante com base no qual se calcula a reforma do período posterior a 31.12.2005, embora já existam declarações do secretário de Estado na Assembleia da República, e são essas que utilizamos aqui; (b) Qual é valor máximo da pensão de substituição do vencimento (90% do vencimento como vigora actualmente na função pública, ou os 80% que é o limite máximo que vigora no Regime Geral da Segurança Social).

A aplicação do esquema que o governo pretende impor poderá determinar situações aberrantes e profundamente injustas como facilmente se concluirá da aplicação a casos concretos. Por ex., poderá suceder que o trabalhador para alcançar o novo limite da idade de reforma tenha de ter mais de 40 anos de serviço, ou que faça descontos que já não têm qualquer efeito na formação da sua pensão de aposentação. Esta última situação acontecerá quando atinja o limite da pensão de substituição que é de 90% do vencimento para os trabalhadores que entraram para a Administração Pública antes de 1993 e é de 80% para os trabalhadores do Regime Geral da Segurança Social, e tenha de continuar a trabalhar para alcançar o novo limite de idade de reforma.

A PREPARAÇÃO DO ATAQUE AO REGIME GERAL DA SEGURANÇA SOCIAL

Na pág. 39 do próprio PEC2005-2009 confessa-se que “de modo a habilitar o governo a tomar as medidas mais adequadas nesta área (Regime Geral) foi criado um grupo de trabalho encarregado de estudar e avaliar as diferentes alternativas de medidas, que deverá entregar a sua avaliação no último trimestre do corrente ano” (2005). E o próprio programa indica que “estas medidas visarão aumentar a sustentabilidade do sistema a longo prazo, tendo em conta a evolução da esperança de vida” (pág. 39). Na pág. 37 do programa diz-se que “a esperança de vida à nascença, actualmente superior a superior a 77 anos, tem crescido de uma forma sustentada , cerca de 10 anos nas últimas três décadas”. No entanto, o programa esquece-se de referir que a previsão para o futuro já não é de um crescimento semelhante, e que as despesas resultantes do envelhecimento da população são em parte compensadas com a diminuição da população mais jovem, e outra parte com o aumento da riqueza criada por cada trabalhador resultante do desenvolvimento cientifico e tecnológico.
Mas o que parece evidente é que se está a preparar um 2º relatório Constâncio, cujos resultados são já mais ou menos conhecidos, como sucedeu com o 1º relatório, e que visam “habilitar o governo a tomar medidas” contra o Regime Geral da Segurança Social, como se afirma no próprio PEC2005-2009.

NA SAÚDE O GOVERNO PRETENDE REDUZIR COMPARTICIPAÇÕES, O QUE ASSOCIADO AO AUMENTO DE IMPOSTOS DETERMINARÁ SUBIDA GENERALIZADA DOS PREÇOS

De acordo com o constante na pág. 42 do próprio PEC2005-2009 o governo tenciona extinguir a “bonificação de 10% na comparticipação dos medicamentos genéricos” e rever o “escalão A de comparticipação de medicamentos, com passagem de 100% para 95%, e o reembolso de doentes crónicos mediante prova de meios, nas situações de rendimento igual ou inferior ao salário mínimo nacional”; portanto um aumento de preços dos medicamentos abrangidos que variará entre 5% e 10%.

Para compensar, e fundamentalmente para ser utilizado na propaganda, o governo promete uma baixa de preços dos medicamentos comparticipados de 3% que seria suportado pelas farmácias e comerciantes de medicamentos (a ver vamos ) e o reembolso da comparticipação perdida pelos doentes crónicos com rendimento total inferior a um salário mínimo nacional (antes teriam de suportar do seu bolso a comparticipação e depois tinham que provar que possuíam um rendimento total mensal inferior a um salário mínimo para serem reembolsados, o que significará na prática que a maioria não será reembolsada da compartição que tiveram de pagar)

É evidente que esta politica de redução de comparticipações nos medicamentos associada ao aumento do IVA, dos impostos sobre os combustíveis, do IT e IA determinará um aumento generalizado dos preços com incidências em 2005 mas fundamentalmente em 2006.

AUSÊNCIA TOTAL DE MEDIDAS PARA REACTIVAR O CRESCIMENTO ECONÓMICO E COMBATER O DESEMPREGO, MA SIM PARA REDUZIR O INVESTIMENTO PÚBLICO

Um aspecto que surpreende em todo este Programa de Estabilidade e Crescimento apresentado pelo governo para o período compreendido entre 2005 e 2009 é ausência quase total de objectivos e de medidas para reactivar o crescimento económico e para combater o grave problema do desemprego que atingiu , no 1º trimestre de 2005, cerca de 550.000 portugueses, o que corresponde a 10% da população activa. Estes problemas – estagnação económica e aumento vertiginoso do emprego - é como não existissem para o governo. As únicas referências que se podem considerar relacionadas com o crescimento económico são relativas ao investimento, e muito negativas.

Assim, logo no inicio do PEC2005-2009 afirma-se que “o investimento público aumentará em média 15% ao ano ao longo da legislatura, compensando parcialmente a redução de fundos estruturais” (pág. 7); portanto, o aumento do investimento público nacional nem conseguirá compensar totalmente a redução prevista no investimento público total, que inclui a parte nacional e a referentes aos fundos comunitários, o que determinará uma diminuição do investimento total público, que nos últimos anos tem diminuído continuamente.

Depois, na pág. 44 do PEC2005-2009 apenas se prevê que “o esforço de modernização e conservação das infra-estruturas, as politicas de solidariedade nacional em apoio ao desenvolvimento regional, incluindo através das SCUTS e da contrapartida nacional para os investimentos financiados pelos fundos comunitários” sejam financiadas somente com “um aumento faseado do imposto sobre produtos petrolíferos (ISP) de 2,5 cêntimos por litro em média a serem introduzidos em 1 de Janeiro de 2006, 2007 e 2008)”;portanto, os investimentos serão financiados pelo aumento dos impostos sobre os combustíveis, o que confirma o seu valor insuficiente face às necessidades do País.

Finalmente, na pág. 52, acaba-se por reconhecer que “o investimento público (abstraindo venda de activos ) sofrerá mesmo alguma redução real até 2007”.

É evidente, que se se verificar uma quebra no investimento público pelo menos até 2007, como se afirma no próprio PEC2005-2009 apresentado pelo governo, é previsível que, por arrastamento, o mesmo se verifique em relação ao investimento privado, o que determinará o agravamento da crise económica e social, mais desemprego e mais recessão.

MAIS PRIVATIZAÇÕES

A privatização maciça das empresas públicas levadas a cabo pelos governos de Cavaco Silva e de Guterres fizeram perder ao Estado um importante instrumento de desenvolvimento e uma fonte importante de receitas para o Orçamento de Estado.

Em termos de financiamento do défice orçamental foi um muito mau negócio. Para concluir isso basta recordar os seguintes dados constantes de um relatório elaborado pelo próprio Ministério das Finanças com o prefácio do ex-ministro das Finanças do PS, Oliveira Martins: Entre 1989 e 1995, as privatizações do sectores bancário e segurador deram receitas ao Estado de apenas 6.827,3 milhões de euros. Entre 1996 e 2001, as receitas arrecadas com a privatizações somaram 15.919,8 milhões de euros, o que somado ao valor anterior totaliza 22.747,1 milhões de euros de receitas. No entanto, segundo um relatório do Tribunal de Contas, os lucros antes dos impostos de apenas 11 empresas públicas e só em 4 anos (1999-2002) somaram 9.176,7 milhões de euros (1.835 milhões de contos), sendo os lucros líquidos, ou seja, depois de pagar os impostos ao Estado, de 7.057,1 milhões de euros (1.411 milhões de contos). Com a privatização de muitas destas empresas, o Orçamento do Estado perdeu uma importante fonte de receitas, e aqueles lucros líquidos e, muitas vezes, até uma parte dos impostos passaram a ser arrecadados pelos grupos económicos que ficaram com essas empresas.

No entanto, apesar desta experiência negativa, de acordo com o PEC2005-2009, “o governo pretende, ainda prosseguir privatizações que, para além do contributo para a consolidação das finanças públicas, através da redução da divida pública, favoreça também o crescimento económico” (pág. 48). A experiência passada mostrou precisamente o contrário. Apesar da venda maciça e muitas vezes ao desbarato de empresas públicas, o País até regrediu em termos económicos.


A APLICAÇÃO AO SECTOR PRIVADO DA MODERAÇÃO DE SALÁRIOS

Antes de apresentar o Programa de Estabilidade e Crescimento o governo afirmou que os vencimentos dos trabalhadores da Administração Pública iriam aumentar em termos reais, embora de uma forma moderada. Isto significava que iriam aumentar mais do que os preços. Os dados constantes do PEC2005-2009 apresentado pelo governo provam que isso não é verdade.

Na pág. 49 do programa o governo afirma “a actualização das tabelas salariais em 2% ao ano” e na pág. 54 prevê que a taxa de inflação aumentará 2,7% em 2005, 2,9% em 2006, e 2,5% nos restantes anos. Isto significa à partida uma diminuição média dos salários reais dos trabalhadores da função pública em mais - 3%. E isto supondo que a taxa de inflação seja a prevista pelo governo, porque a experiência passada tem mostrado que as previsões do governo ficam sempre abaixo da realidade.

E neste campo o governo não se coíbe de dar uma ajuda às entidades patronais. Assim na pág. 55 do PEC2005-2009 afirma que “é essencial que no horizonte do Programa (2005-2009) a negociação salarial seja realista e tenha em conta as condições acrescida nos mercados internacionais e no mercado doméstico em que deparam hoje os produtos portugueses. Neste contexto, espera-se um crescimento moderado das remunerações reais dos trabalhadores abaixo do crescimento da produtividade” . Tal como o patronato o governo também pensa que o aumento da competitividade das empresas portuguesas passa pela manutenção de baixos salários. E com esse objectivo dá como orientação o que pretende impor à Administração Pública.

UM PROGRAMA NÃO DE CRESCIMENTO MAS SIM DE ESTAGNAÇÃO ECONOMICA

Devido à fragilidade do tecido económico e social em Portugal, a Administração Pública é essencial em Portugal para a coesão social e para o crescimento económico. E mais numa época em que impera uma globalização dominada por uma liberação selvagem que determina uma concorrência global agressiva e muitas vezes desleal que gera inseguranças e a destruição do tecido económico e social nacional. A acrescer a tudo isto numa altura em que o País enfrenta uma grave crise económica e social.

Um ataque como aquele que o governo está a desencadear contra a Administração Pública e contra os seus trabalhadores é não perceber os graves problemas que o País enfrenta, é criar condições para um maior agravamento da crise económica e social.

A juntar tudo isto, e também contrariando o que tem continuamente declarado o governo, o investimento público, que inclui o investimento público nacional e o investimento público comunitário, vai diminuir em termos reais pelo menos até 2007. E isto no cenário mais favorável. Se as exportações não crescerem tanto como o previsto (e poderá acontecer), se o preço do petróleo continuar a subir (poderá suceder) e se o PIB não crescer como o previsto ( e já vimos que o governo e o Banco de Portugal não são fortes em previsões; a prová-lo está o facto do dr. Constâncio afirmar no seu relatório que o crescimento económico em 2005 seria de 1% e três dias depois o ministro das Finanças vir dizer que já não era verdade, pois o crescimento em 2005 seria apenas de 0,8%) , então o governo tomará medidas ainda mais restritivas para que a meta do défice seja alcançada. E tudo em contra-ciclo o que agravará ainda mais a crise económica e social.

Eugénio Rosa
Economista
Tel. 91 757 6313
edr@telapec.pt
[1] A forma de calcular a pensão está mais pormenorizadamente explicada no estudo que está no “site” do Sindicato da Função Pública : www.stfpsa.pt

AS “PALAVRAS-VENENO” DO SEMANÁRIO «EXPRESSO» CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

A PERCENTAGEM DOS TRABALHADORES NA ADMINISTRAÇÃO PUBLICA EM PORTUGAL REPRESENTA APENAS 58% DA MÉDIA DOS PAISES DA UNIÃO EUROPEIA

O semanário Expresso de 5 de Maio p.p., caracterizou a situação da Administração Pública em Portugal nos seguintes termos: “retrato ainda mais negro”, “crescimento imparável”, “o prometido emagrecimento da Função Pública (…) não teve quaisquer resultados”, etc., ou seja, utilizou termos que na ciência da comunicação se chamam “palavras-veneno” com o intuito de provocar sentimentos negativos no leitor relativamente à Administração Pública e aos seus trabalhadores.

No entanto, a análise objectiva do chamado "peso" da Administração Pública em Portugal e em outros países da União Europeia utilizando dados publicados pelo «Eurostat», o serviço oficial de estatística da U. E., mostra o seguinte: a) Tomando com base os trabalhadores da “Administração Publica, Defesa e Segurança”, e fazendo a análise tendo como base um conjunto constituído por doze países representativos da U. E./15, conclui-se que a percentagem que representa os trabalhadores empregues nesse subsector em Portugal (6,8% da população total empregada) corresponde apenas a 88% da média dos doze países analisados (7,7%); b) Se somarmos à percentagem de população empregue na “Administração Pública, Defesa e Segurança” as percentagens referentes à “Educação” e à “Saúde e Acção Social”, obtemos para Portugal 18% da população empregada total, enquanto a média dos doze países da União Europeia analisados atinge 25,6%, ou seja, é superior à percentagem portuguesa em 42,2%; c) Se realizarmos uma análise mais fina, concluímos que a percentagem portuguesa, na “Educação “, corresponde a 85,9% da média dos doze países analisados e, na “Saúde e Acção Social”, somente a 47,2% da média dos doze países analisados (quadro I).

Estes dados oficiais do serviço de estatística na União Europeia revelam um aspecto importante que tem sido sistematicamente esquecido quer no discurso daqueles que atacam a Administração Pública, e que falam num “crescimento imparável” como fez o “Expresso”, quer mesmo no discurso oficial, a saber: a percentagem de trabalhadores, relativamente à população total empregada, naqueles sectores fundamentais para a segurança e bem estar da população em Portugal está muito abaixo da verificada nos países desenvolvidos da União Europeia. Privatizar esses serviços ou reduzir a dimensão publica desses serviços apenas significará que eles serão fornecidos por privados com custos mais elevados para a população, excluindo o seu acesso àqueles que não tiverem dinheiro para os pagar. Não corresponde à verdade afirmar, como é normalmente é feito, que fazendo-os sair da área pública isso representaria um beneficio para a população. Como mostra a experiência dos países mais desenvolvidos, Portugal não conseguirá desenvolver-se reduzindo “o peso” destes sectores fundamentais como está implícito no discurso, mas não explícito, porque quem o afirma não tem a coragem de o dizer, claramente, contra a Administração Pública.

Por outro lado, se se analisar a evolução do número de inscritos na Caixa Geral de Aposentações conclui-se que, a partir de 2002, o seu número tem baixado, tendo-se registado uma diminuição significativa em 2004. E tenha-se presente que estão inscritos na CGA não só funcionários e agentes públicos, mas também trabalhadores de empresas públicas e até professores do ensino privado superior (quadro II).

No período compreendido entre 1993 e 2004, o Estado e outras entidades empregadoras entregaram à CGA para pagar pensões de reforma e de aposentação 23.606 milhões de euros (4.733 milhões de contos). No entanto, se tivessem entregue o correspondente a 23,75% das remunerações que pagaram, como sucede com as outras entidades empregadoras em Portugal, no lugar do valor anterior deviam ter entregue à CGA 30.970 milhões de euros (6.209 milhões de contos), portanto entregaram menos 7.369 milhões de euros (1.477 milhões de contos). A preços actuais (de 2005), aquele valor corresponde a 9 223 milhões de euros (1 850 milhões de contos). Esta importância – 9 223 milhões de euros - pode ser considerada como uma dívida do Estado e de outras entidades empregadoras à Caixa Geral de Aposentações. E isto só referente ao período compreendido entre 1993 e 2004, pois se o cálculo fosse feito para o período em que existe a CGA, o valor desta dívida seria certamente muito mais elevado, pois só agora é que a segurança social dos trabalhadores da Administração Pública atingiu a sua maturidade (quadro III e IV).

Finalmente, interessa recordar, porque esse facto é sistematicamente esquecido, que já cerca de 350000 trabalhadores da Administração Pública inscritos na CGA estão abrangidos pelo Regime Geral da Segurança Social e que, com o passar dos anos, todos os trabalhadores da função pública ficarão abrangidos por este regime. Isto significa que a forma de calcular as suas pensões de reforma e de aposentação será igual à dos trabalhadores por conta de outrém do sector privado. Portanto representa uma autêntica mistificação afirmar, como muitas vezes sucede, que a segurança social de todos os trabalhadores da Administração Pública é diferente da dos outros trabalhadores. A diferença que existe é relativamente aos trabalhadores mais antigos que têm direitos adquiridos, e mesmo em relação a estes as suas pensões nunca poderão ser superiores a 89% da sua remuneração.

A Administração Pública tem um papel fundamental no fornecimento de serviços essenciais à população, como são os serviços de saúde, de educação, de segurança social e ainda de outros importantes para a vida dos portugueses, em particular dos trabalhadores. Apesar de não existirem estudos credíveis sobre a dimensão adequada da Administração Pública em Portugal, pois isso até exigiria que previamente se estabelecessem objectivos, e neste momento nem o Governo conhece o número exacto dos trabalhadores da Administração Pública (o último Censo é de 1999), mesmo assim os ataques à Administração Pública e aos seus trabalhadores não param em Portugal.


O ataque mais recente a nível dos "media" foi feito pelo semanário «Expresso» que, no seu número de 8 de Maio p. p., utilizando dados cuja fonte se desconhece, mas que merecem pouca credibilidade, publicou uma peça jornalística sobre a Administração Pública em Portugal recheada de frases do tipo: “retrato ainda mais negro”; “crescimento imparável”; “ o Ministério da Educação continua a ser o que mais pesa”; “o prometido emagrecimento da Função Pública (…) não teve quaisquer resultados”, etc. . Desta forma substituíu a informação objectiva que diz defender por um processo clássico de manipulação, que consiste em procurar associar na mente do leitor a Administração Pública a “palavras-veneno”, que geram em quem as lê sentimentos negativos em relação àquela.

OS DADOS DO «EUROSTAT» SOBRE A DIMENSÃO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA NOS PAÍSES DA UNIÃO EURIOEIA

Não existem dados rigorosos sobre o número actual de trabalhadores na Administração Pública nos diferentes países da União Europeia que permita fazer uma análise da dimensão da Administração Pública em cada um deles, mas os dados publicados pelo "Eurostat", embora indicativos, desmentem claramente o retrato negro que se pretende dar em Portugal da Administração Pública. Para concluír isso, basta observar os dados constantes do Quadro I, que a seguir se apresenta, disponíveis na publicação «L´Emploi en Europe 2 003», publicada pela Comissão Europeia – portanto uma fonte oficial credível e conhecida, bem diferente da "fonte" utilizada pelo semanário «Expresso».


QUADRO I – Percentagem da população total empregada com idade entre os 15 e 64 nas áreas de responsabilidade dominante do Estado


PERCENTAGEM DO EMPREGO TOTAL – Ano 2 002

População 15–64 anos
PAÍSES
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
EDUCAÇÃO
SAÚDE E
TOTAL

DEFESA, SEGURANÇA SOCIAL

ACÇÃO SOCIAL

Bélgica
9,6%
8,1%
12,4%
30,1%
Dinamarca
5,8%
7,8%
18,4%
32,0%
Suécia
5,7%
8,2%
18,7%
32,6%
Alemanha
8,0%
5,6%
10,4%
24,0%
Itália
8,7%
7,4%
6,1%
22,2%
Grécia
7,6%
6,4%
4,6%
18,6%
Irlanda
5,2%
6,4%
9,1%
20,7%
Luxemburgo
11,3%
7,0%
7,9%
26,2%
Holanda
7,6%
6,6%
15,1%
29,3%
França
9,3%
7,6%
10,6%
27,5%
Inglaterra
6,7%
8,2%
11,1%
26,0%
Espanha
6,3%
5,9%
5,5%
17,7%
Media 12 países
7,7%
7,1%
10,8%
25,6%
PORTUGAL
6,8%
6,1%
5,1%
18,0%
FONTE: «L´Emploi en Europe ­– 2003», pág. 37 (Comissão Europeia)


Se a análise for feita com base nos dados da coluna com o título «Administração Pública, Defesa e Segurança Social» do quadro anterior, referente ao conjunto dos doze países representativos da União Europeia analisados, concluímos que, desses doze países, apenas cinco – Dinamarca, Suécia, Irlanda, Reino Unido e Espanha – apresentam percentagens de trabalhadores inferiores à de Portugal. Nos restantes sete países a percentagem que representam os trabalhadores da «Administração Pública, Defesa e Segurança Social» em relação à população total empregada é superior e, em vários casos, bastante superior à percentagem portuguesa. A média dos doze países (7,7%) é superior à percentagem portuguesa (6,8%) em cerca de 13,2%.

Se somarmos à percentagem anterior as percentagens constantes das colunas «Educação» e «Saúde e Acção Social», também do Quadro I, que são áreas onde é dominante também a presença da Administração Pública, concluímos que a percentagem portuguesa – apenas 18% da população empregada total - é consideravelmente inferior à percentagem registada em todos os outros países da União Europeia constantes do Quadro anterior, com excepção da Espanha, que é praticamente igual à portuguesa (17,7%). O valor de Portugal (18%) corresponde a cerca de 70% da média dos doze países analisados (que é 25,6%). Na «Educação», a percentagem portuguesa representa só 85,9% da média dos doze países e, na «Saúde e Acção Social», corresponde apenas a 47,2% da média dos doze países analisados, constantes do Quadro I.

Estes dados oficiais do serviço de estatística da União Europeia revelam um aspecto importante, que tem sido sistematicamente esquecido quer no discurso daqueles que atacam a Administração Pública, quer mesmo no discurso oficial, a saber: a percentagem de trabalhadores, relativamente à população total empregada, nos sectores fundamentais para a segurança e bem-estar das populações, em Portugal está muito abaixo do verificado nos países desenvolvidos da União Europeia! Privatizar esses serviços, ou reduzir a dimensão pública dos mesmos, apenas significará que eles serão fornecidos por entidades privadas, com custos mais elevados para as populações. É uma inverdade, para não dizer mesmo que é uma grande mentira, afirmar que a saída destes serviços da área pública para a área privada representará um benefício para a população, como está implícito no discurso de todos aqueles que atacam a Administração Pública.


Desta forma, fica destruído o “retrato ainda mais negro” agitado pelo semanário «Expresso», quando o comparamos com os países da União Europeia a que Portugal também pertence.

O NÚMERO DE INSCRITOS NA CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES NÃO AUMENTA DESDE 2002

Contrariamente àquilo que o semanário «Expresso» pretendeu também fazer crer o número de trabalhadores inscritos na C. G. A. não tem aumentado desde 2002, e até diminuíu em 2004 como provam os dados oficiais constantes do Quadro II, que foram retirados dos Relatórios de Contas da Caixa Geral de Aposentações (C. G. A.).


QUADRO II – Número de inscritos na C. G. A. de 1995-2004, e número dos novos inscritos em cada ano e daqueles que se aposentam ou reformam

ANOS
N.º
NÚMERO DE “NOVOS”

SUBSCRITORES
APOSENTADOS/REFORMADOS
SUBSCRITORES
1993
661.347
34.237
+ 11.217
1994
638.327
41.067
+ 18.047
1995
637.749
27.596
+ 27.018
1996
647.893
22.098
+ 32.242
1997
654.228
20.235
+ 26.570
1998
681.169
16.411
+ 43.352
1999
709.167
16.172
+ 44.170
2000
747.449
15.646
+ 53.928
2001
771.285
14.969
+ 38.805
2002
778.782
22.207
+ 29.704
2003
778.357
34.067
+ 33.642
2004
737.355
22.264
-18.738
FONTE: Relatórios e Contas : 1998-2004


A partir de 2001, o número de subscritores deixou de aumentar, tendo mesmo registado uma diminuição importante em 2004. E essa diminuição não resultou apenas da aposentação ou reforma de trabalhadores, como também provam os dados do Quadro anterior. No entanto, é preciso ter presente que na C. G. A. não estão apenas inscritos funcionários e agentes públicos, pois também existem trabalhadores de várias empresas públicas e os professores do ensino privado superior. Por essa razão, o número de subscritores, ou seja, de trabalhadores inscritos na C. G. A., não coincide com o número de trabalhadores da Administração Pública. O número de inscritos na C. G. A. deverá ser apenas considerado como um indicador, no entanto bastante representativo; por isso é legítimo, a nosso ver, concluír que a tendência verificada ao nível dos subscritores também seja válida para todos os trabalhadores da Administração Pública e que se deve ter verificado nos últimos anos uma redução do número destes.


O DÉFICE FICTÍCIO DA C. G. A. AGITADO NOS MEDIA E A DÍVIDA DO ESTADO À C. G. A. ATINGIRAM, NOS ÚLTIMOS 12 ANOS, 9 223 MILHÕES DE EUROS (1 850 milhões de contos)

Um outro ataque frequente contra os trabalhadores da Administração Pública é feito em relação ao seu sistema de segurança social. E o argumento utilizado é o de que ele gera um défice crescente, que é incomportável para o Orçamento Geral do Estado. É precisamente com base neste argumento que o actual Governo inscreveu no seu Programa o aumento da idade de aposentação dos trabalhadores da Administração Pública. Para fundamentar este ataque deturpa-se a verdade como se mostrará seguidamente.


Para compreender os défices da C. G. A. de que tanto se fala, e que são fictícios, é preciso compreender como eles são fabricados.


Contrariamente ao que sucede com qualquer empregador no nosso País, o Estado não contribui para a Caixa Geral de Aposentações com 23,75% das remunerações que paga. Na verdade não paga nada, apenas transfere para a Caixa Geral de Aposentações aquilo que é necessário para pagar as pensões de aposentação e de reforma daqueles trabalhadores que já se aposentaram ou reformaram. Depois chama, abusivamente, a estas transferências “subsídios” e à soma deles chama “défice”, como se não tivesse quaisquer obrigações como empregador! Os trabalhadores da função pública, tal como sucede com todos os outros os trabalhadores do País, descontam 11% nas suas remunerações, sendo 10% para a C. G. A. e 1% para a ADSE.


Com base em dados oficiais constantes dos Relatórios da C. G. A., calculámos aquilo que o Estado e outras entidades públicas e privadas que têm trabalhadores inscritos na C. G. A. deveriam ter entregue à C. G. A., se tivessem contribuído para as reformas dos trabalhadores que empregam com 23,75% das remunerações que pagam, como sucede com qualquer outra entidade patronal em Portugal, e depois comparámos os valores obtidos dessa forma com aqueles que foram efectivamente entregues à C. G. A. pelo Estado e pelas outras entidades. Os dados utilizados, assim como os resultados desses cálculos para os últimos doze anos (1993–2004), constam do quadro que se apresenta seguidamente.

QUADRO III – VALORES NÃO ENTREGUES PELO ESTADO E POR OUTRAS ENTIDADES PÚBLICAS À CAIXA GERAL DE APOSENTALÕES NO PERÍODO 1993-2004

Milhões de contos

Milhões de euros
RUBRICAS
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
SOMA
2002
2003
2004
SOMA
Quotizações dos
Trabalhadores
119
157,5
169
179,7
186,1
203
223
244
270
1.751,3
1.415
1.446
1.462
4.323
Contribuições das
Entidades empregadoras
18,3
23,3
25,6
27,8
28,3
32
37
39
44
2.75,3
256
410
456
1.122
“Subsídios” do Restado
136,3
156,6
233
274,4
312,5
346
362
405
402
2.627,8
2.355
2.543
3.106
8.004
PAGO À CGA PELO ESTADO+ENTIDADES
155
180
259
302
341
378
399
444
445
2.903
2.611
2.953
3.562
9.126
MASSA SALARIAL
1190
1575
1690
1797
1861
2030
2.227
2.439
2.699
17.508
14.154
14.460
14.460
43.074
ESTADO + ENTIDADES
DEVIAM PAGAR (23,75% da Massa Salarial)
283
374
401
427
442
482
529
579
641
4.158
3.362
3.434
3.434
10.230
NÃO ENTREGUE À CGA (Dívida)
128
194
143
125
101
104
130
135
196
1.256
750
482
-128
1.104
FONTE: Relatórios de Contas da C. G. A.: 1993–2004

NOTA EXPLICATIVA PARA O LEITOR AVALIAR A CONSISTÊNCIA TÉCNICA:

Os dados do quadro anterior foram obtidos da seguinte forma: os dados inscritos na linha com a designação “PAGO À CGA POR ESTADO + ENTIDADES” constam dos Relatórios de Contas da CGA. Com base nas “Quotizações dos trabalhadores“, cujos valores constam também dos Relatórios de Contas da CGA calculou-se a “MASSA SALARIAL“, o que é fácil, já que as quotizações constantes do quadro correspondem a 10% das remunerações pagas. Calculada desta forma a “MASSA SALARIAL”, aplicou-se a taxa de 23,75%, que é o que paga ou devia pagar para a Segurança Social qualquer entidade empregadora no nosso País, incluindo o Estado e pessoas colectivas públicas, e obtiveram-se dessa forma os valores constantes da linha que tem a designação de “ESTADO + ENTIDADES DEVIA ENTREGAR”.

Como rapidamente se conclui, os valores que o Estado e outras entidades deveriam ter entregue para a C. G. A., se contribuíssem com aquilo que contribui qualquer entidade patronal no nosso País (o correspondente a 23,75% das remunerações), é muito superior ao que pagaram à C. G. A.! Fizeram-se cálculos apenas para os últimos doze anos e a soma dos “TOTAIS” do quadro anterior constam do Quadro IV, que se apresenta seguidamente para uma mais fácil visualização.


QUADRO IV – “Dívida” actual do Estado e das outras entidades empregadoras à Caixa Geral de Aposentações (apenas referente ao período 1993-2004)


TOTAL: 1993-2004
RUBRICAS
Em
Milhões de contos.
Em
Milhões de euros
Quotizações dos trabalhadores
2.618
13.058
Contribuições das entidades empregadoras
500
2.495
“Subsídio” do Estado (Transferências do Estado)
4.232
21.111
PAGO À CGA POR ESTADO + OUTRAS ENTIDADES
4.733
23.606
MASSA SALARIAL
26.144
130.404
ESTADO + ENTIDADES DEVIAM ENTREGAR (23,75% da Massa Salarial)
6.209
30.970
NÃO ENTREGUE À CGA (Dívida acumulada do Estado e outras entidades)
1.477
7.369

Assim, se o Estado e as outras entidades tivessem contribuído com 23,75% das remunerações, como está obrigada qualquer entidade patronal no nosso País, a C. G. A. teria recebido, a preços constantes, só no período compreendido entre 1993 e 2004, mais 7 369 milhões de euros do que o que recebeu, ou seja, o correspondente a cerca de 1 477 milhões de contos, na moeda antiga!

Estes valores, se fossem actualizados utilizando a taxa de inflação, correspondem já, a preços actuais (de 2005), a uma “dívida” do Estado à C. G. A. que se estima em 9 223 milhões de euros (1 850 milhões de contos!).

E tenha-se presente que estes valores se referem apenas aos últimos doze anos, porque se se tivessem efectuado os cálculos para um período mais dilatado, certamente os valores obtidos teriam sido muito maiores.

É evidente que se o Estado e as outras entidades públicas tivessem entregue à C. G. A. o mesmo que qualquer outra entidade patronal é obrigada a pagar para a segurança social dos seus trabalhadores no nosso País (23,75% da “massa salarial”), e se esse fundo tivesse sido convenientemente gerido, as reservas acumuladas seriam certamente suficientes para respeitar os direitos adquiridos pelos trabalhadores da Administração Pública.

MAIS DE 350 000 TRABALHADORES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA JÁ ESTÃO ABRANGIDOS PELO REGIME GERAL DA SEGURANÇA SOCIAL

De acordo com Art.º 1º do Decreto-Lei n.º 286/93, “a pensão de aposentação dos subscritores da Caixa Geral de Aposentações inscritos a partir da entrada em vigor do presente diploma é calculada nos mesmos termos das normas legais aplicáveis ao cálculo das pensões dos beneficiários do regime geral da segurança social”.

Isto significa que para todos os trabalhadores que entraram para a função pública depois de 1 de Setembro de 1993, quando se reformarem, a sua pensão será calculada da mesma forma que é calculada a dos trabalhadores abrangidos pelo regime geral da segurança social. Portanto, a pensão máxima que poderão vir a receber quando se reformarem ou aposentarem será o correspondente a 80% do chamado "salário pensionável", tal como acontece com todos os restantes trabalhadores portugueses que descontam para a segurança social.

De acordo com uma estimativa que fizémos com base no aumento de subscritores na C. G. A. entre 1993 e 2004, assim como no número daqueles trabalhadores que se aposentaram ou reformaram neste mesmo período, concluímos que o número daqueles que já estão nestas condições atinge actualmente cerca de 46% de todos os trabalhadores inscritos na C. G. A., ou seja, já são perto de 350000. E estimamos que, daqui a cerca de dezasseis anos, todos os trabalhadores da função pública já estejam abrangidos pelas mesmas condições do Regime Geral da Segurança Social, ou seja, quando se aposentarem, a sua pensão será calculada da mesma forma como é determinada a pensão de reforma dos restantes trabalhadores portugueses abrangidos por este regime, pois esta é a estimativa de tempo máximo para que todos os trabalhadores ainda abrangidos pelo antigo regime se aposentem ou reformem.

Para além disso, mesmo os trabalhadores da função pública abrangidos pelo regime que vigorou até 1993, quando se reformarem, já não receberão a remuneração por inteiro, como muita gente pensa ou afirma, sendo o valor máximo da pensão que é possível receber igual a 89% da remuneração bruta que tinham quando estavam no activo.

Assim, a afirmação daqueles que atacam o sistema de segurança social dos trabalhadores da função pública de que o “fosso” entre os trabalhadores da função pública e os restantes trabalhadores vai aumentar, assim como vão crescer de uma forma incomportável as despesas da C. G. A.", não tem qualquer credibilidade e sustentação técnica ou científica; o que vai acontecer é precisamente o contrário, como facilmente se conclui da análise feita com base nos dados oficiais. Da mesma maneira, a intenção de aumentar a idade de reforma, constante do Programa do actual Governo, também não tem qualquer justificação técnica, ou legal, e representaria uma violação dos direitos adquiridos por estes trabalhadores.

15 de Maio de 2005.

Eugénio Rosa,
Economista

edr@mail.telepac.pt

Tel. 91 757 6313

sexta-feira, junho 17, 2005

OS PARQUÍMETROS E A CONTRATAÇÃO DE PESSOAL NA ADMINISTRAÇÃO LOCAL

Os autores dos manuais de texto (os quais, de vez em quando, convém questionar para que o conhecimento humano possa evoluir) costumam referir que o preço pode funcionar como um factor de restrição da acessibilidade.

Nesta perspectiva, se introduzirmos o estacionamento pago nas cidades (aqui entendidas genericamente como aglomerados urbanos de maior dimensão e com maior nível de funções), estaremos (segundo tais autores) a limitar o acesso ao estacionamento e, também, a potenciar o aumento da sua rotatividade (isto é, o número de utilizadores de um espaço de estacionamento por unidade de tempo, por exemplo, por dia).

Sendo conhecida a “fúria cobradora” da generalidade dos nossos decisores públicos (até porque dá menos trabalho, tem menores custos políticos e exige menos capacidades de gestão do que racionalizar a despesa), cedo se chegou à generalização do estacionamento pago nas cidades.

Criou-se assim uma nova excitação autárquica: a introdução de parquímetros. E é ver os(as) nossos(as) Autarcas felizes a aumentarem as receitas dos seus orçamentos – que são depois aplicadas (mesmo na ausência formal de consignação de verbas) em admissões de pessoal administrativo com o 9.º ano de escolaridade e/ou de licenciados em relações internacionais (que é o que mais falta faz aos municípios, e aos munícipes, como se sabe) – vendendo-nos a imagem do(a) grande justiceiro(a) que quer “pôr ordem” e dar solução aos problemas de circulação e de estacionamento. O parquímetro surge assim como um tudo em um, uma espécie de totoloto municipal: fácil, barato e potencialmente gerador de milhões.

E o que é que verificamos? Os lugares de estacionamento passaram a ficar vazios? Não. Aumentou a rotatividade, ou seja, passámos a encontrar estacionamento disponível com mais facilidade? Não. Os lugares de estacionamento mantêm-se permanentemente ocupados (ou quase), indisponíveis, a um custo acrescido para o cidadão (pago no parquímetro). Continua o inferno da falta de estacionamento, mas agora com a punição adicional do pagamento para quem o consegue encontrar.

Alguém estudou, seriamente, a rotatividade do estacionamento nas cidades e a forma como ele evoluíu ao longo do tempo, por exemplo, no período pós-parquímetro?

Os mais fundamentalistas vão dizer que a culpa é do próprio cidadão, que não sabe gerir os seus recursos e que poderia (e deveria?) perfeitamente utilizar o sistema de transportes públicos que existe. Convinha que esses especialistas se interrogassem sobre as razões que levam o cidadão a optar pelo transporte individual. Ou, de preferência, que lhe perguntassem de forma estruturada, através de uma sondagem de opinião.

Seria também interessante saber, do total de especialistas que nos querem convencer da superioridade do transporte público que existe, quantos deles utilizam o transporte individual.

Uma política de preços adequada deveria levar então ao aumento sucessivo dos preços a) até que se obtivesse o preço óptimo, isto é, até que se verificasse uma estabilização das receitas (quantidade vendida * preço unitário), para concretizar o objectivo não anunciado de aumentar o nível de receita dos municípios e/ou das empresas municipais que, em regime de monopólio, exploram esse serviço, ou b) até que se verificasse, e depois de se verificar, uma quebra nas receitas, para concretizar o objectivo anunciado de limitar o tráfego e o estacionamento nas cidades.

Porém, não é isso o que se verifica. O que pode acontecer por várias razões, desde a falta de conhecimentos técnicos de gestão, ou de capacidade intelectual dos decisores, até ao receio de perder receitas, passando pela pura inércia (Nota – a perda de receitas resultaria de menos estacionamento, ou de mais rotatividade no estacionamento nas cidades, que é o objectivo que o estacionamento pago pretende atingir, certo?).

Vou passar por cima da “sobre-cobrança” implícita no sistema de parquímetros. Refiro apenas que, sendo um sistema pré-pago de compra de segmentos de tempo (definidos pelo operador) e sem direito a devolução ao Cliente do tempo não utilizado (em crédito de tempo ou em numerário), o Cliente cumpridor, que não quer correr riscos de multa, paga sempre minutos que não utiliza (dado que é disparatado ficar dentro do automóvel, ou fora dele, a “consumir” os minutos que faltam para o fim do período pago, quando a necessidade do Cliente é precisamente a contrária: retirar o veículo do estacionamento para prosseguir com as suas actividades diárias).

Saltarei igualmente a questão da legitimidade jurídica (a moral parece não oferecer dúvidas) da cobrança de estacionamento em espaço público, espaço que antes de ser público foi privado. Porém, seria interessante ver como reagiria um Município que – apesar de cobrar taxas de urbanização usurárias (que os munícipes pagam depois no preço final da habitação) – visse um promotor imobiliário a “privatizar” todo o estacionamento em projectos de novos empreendimentos urbanísticos ou a torná-lo público apenas mediante a garantia, dada pelo Município, de que a) seria gratuito, ou b), deixando de ser gratuito, toda a receita gerada reverteria para o mesmo promotor.

Falemos claro. O estacionamento pago não se destina a limitar o estacionamento (destina-se a permiti-lo mediante um pagamento), nem a contribuir para o ordenamento do tráfego e da circulação automóvel, mas sim a aumentar as receitas dos Municípios, directamente, ou através das Empresas Municipais que o gerem.

O princípio subjacente é o que se verifica nas contas públicas: mais receita para permitir mais despesa (e é grande a capacidade para gerar sempre novas ideias para gastar mais dinheiro e para manter ou aumentar o desperdício).

Se o objectivo fosse limitar o estacionamento, existiriam soluções mais eficazes:

- impedir a entrada do transporte individual nas cidades (mesmo que o Cliente estivesse disponível para pagar uma portagem*); o que exigiria a criação de parques de estacionamento (pagos?) junto aos “postos de controlo”;

*(Nota – quem sugere a introdução de portagens à entrada das cidades – e há sempre exemplos noutros países, de aumento da receita municipal, mas nunca de redução da respectiva despesa, que alegadamente servem de caução a estas medidas populistas e justiceiras – está já a pensar na dupla excitação da “portagem à entrada + parquímetro à chegada”, o que, por seu turno, dará imenso jeito para se poder aumentar ainda mais a despesa municipal com a admissão de pessoal administrativo com o 9.º ano de escolaridade e/ou de licenciados em relações internacionais, ou até mesmo, quem sabe, para se “investir” em mais uma “rotundazinha” com repuxo e/ou com uma estátua feita por um escultor amigo…)

- eliminar a possibilidade de estacionamento (mesmo que o Cliente estivesse disponível para alimentar com moedas um qualquer parquímetro).

Este caso é mais um a confirmar que o “princípio” do utilizador-pagador é apenas um fim. Aliás, gostaria de voltar a este assunto – o fim do utilizador-pagador – numa próxima oportunidade.


João de Andrade e Sousa,

15.Jun.2005